Ousar é preciso

O setor de cacau e chocolate brasileiro diante dos desafios da internacionalização
Arnaldo Francisco Cardoso

No fim de outubro, aconteceu em Paris mais um Salão do Chocolate (Salon du Chocolat) que reuniu profissionais de todo o mundo mostrando as inovações em produtos e processos deste setor que movimenta mais de US$ 100 bilhões anualmente. E como ocorreu nas últimas edições do evento, produtores brasileiros marcaram presença. Neste salão, amêndoas de cacau de duas fazendas brasileiras – Fazenda Panorama (PA) e Fazenda Leolinda (BA) – integraram o seletíssimo grupo e disputaram o prêmio do Programa Internacional Cacau de Excelência. Os dois referidos produtores brasileiros são exemplares de um movimento que vem ganhando corpo no setor cacaueiro do Brasil, visando agregar valor ao produto premium. Uma das primeiras conquistas desse movimento foi o recente reconhecimento da Organização Internacional do Cacau (ICCO, na sigla em inglês) certificando o país como produtor e exportador de cacau fino.

Historicamente o setor de cacau e chocolate do Brasil operou na moldura de um setor voltado ao atendimento do mercado interno, que ocupa a quinta posição no ranking internacional de consumo de chocolate (500 mil/t ano).

No que tange à internacionalidade do setor no Brasil, ela é marcada pela presença de empresas globais sem a contrapartida (salvo algumas exceções) de empresas brasileiras no exterior. A experiência internacional mostra que, estrategicamente, um setor que enfrenta o aumento da presença de competidores estrangeiros em seu mercado passa a considerar a sua internacionalização como um caminho inescapável para a manutenção de competitividade e sustentabilidade econômica de suas empresas.

O setor do cacau e chocolate do Brasil vive um momento que tem sido percebido por muitos como de um renascimento. A maturidade do setor, com avanços na organização de produtores e marcas brasileiras consolidadas no mercado nacional, lança indagações sobre o momento em que se dará sua internacionalização. Embora o histórico de internacionalização de empresas brasileiras de diferentes setores mostre que foram as de grande porte as que lideraram esses movimentos, no setor do cacau e chocolate o que temos visto, até o momento, tem contrastado com esse histórico.

Merece atenção as ações das pequenas e médias empresas do segmento bean-to-bar (do grão de cacau à barra de chocolate) que têm mostrado grande desenvoltura na promoção do chocolate brasileiro de qualidade no exterior. Ouvindo-as, tomamos conhecimento do interesse e demanda estrangeira pelo produto brasileiro, especialmente os de origem. Muitas delas têm realizado exportações regulares para diferentes mercados, com destaque para o japonês.

A integração em redes de relacionamentos comerciais para compartilhamento de conhecimentos e interesses constitui-se em poderosa ferramenta para abrir caminhos e servir de termômetro para a implementação de um plano de ações visando a internacionalização. A participação em feiras internacionais do setor também cumpre papel importante nesse processo. A formação de uma mentalidade internacional, através de cursos junto a equipes de colaboradores de empresas nacionais, contribui também para a realização desse salto qualitativo.

A entrada em mercados internacionais envolve incertezas, complexidade e riscos e entre seus benefícios destacam-se o fortalecimento de posição competitiva da empresa e a diminuição da dependência do mercado doméstico. Além de planejamento estratégico embasado em bom sistema de informação, uma certa dose de ousadia é sempre necessária para converter oportunidades em realizações. •

Arnaldo Francisco Cardoso é pesquisador e professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie Alphaville. Atua nas áreas de Economia, Política e Negócios Internacionais.

Deixe um comentário

Novos Tempos