Uma dissertação de mestrado realizada na Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) revelou que sons de alta frequência podem alterar nossa percepção de dulçor ao comer um chocolate meio amargo. Realizado pela engenheira de alimentos Renata Shimizu, sob orientação do professor Jorge Behrens, o trabalhou também indicou que a interação entre o chocolate meio amargo e determinadas músicas desperta emoções distintas nas pessoas.
Segundo a pesquisadora, o estudo comprova a eficácia de sonoridades para a construção de experiências de consumo alimentar, abrindo amplas possibilidade de harmonizar comida e música.
Batizada de “Com música ou sem música: um estudo sobre o efeito cross-modal de sons doces e amargos numa experiência de consumo de chocolate”, a dissertação de mestrado aborda as relações resultantes da interação entre o alimento e os cinco sentidos (tato, olfato, paladar, visão e audição). Conhecida como cross-modalidade, essa interação tem entre seus exemplos mais conhecidos a atribuição da cor amarela ao gosto cítrico.
Após analisar outros trabalhos acadêmicos sobre a tema, a engenheira de alimentos buscou utilizar peças musicais compostas a partir de um arranjo de notas e timbres particulares, em uma faixa de frequência específica
A especialista conta que o que determina o “gosto” da música é a combinação entre frequência sonora e modulação. Assim, sons agudos, ou de alta frequência, são caracterizados como doces. Sons graves, ou de baixa frequência, seriam amargos.
Gordura do cacau
O chocolate meio amargo foi escolhido pela pesquisadora por sua capacidade de gerar expectativa e de aguçar os sentidos. “Nada substitui a gordura do cacau na geração de textura, e textura é uma dimensão”, disse a engenheira ao Jornal da Unicamp.
A primeira fase da pesquisa usou três amostras de chocolate da marca Barry Callebaut com diferentes porcentagens de cacau. Os produtos foram provados por voluntários, que depois responderam a um questionário para apontar qual apresentava o melhor equilíbrio entre doce e amargo. Dessa forma, chegou-se ao chocolate com 54,5% de cacau.
Para validar a associação de gostos às músicas selecionadas, o trabalho contou com a participação de 313 usuários de redes sociais. Para a maioria deles, a música de frequência grave foi considerada amarga, enquanto a de frequência aguda foi apontada como doce.
Em outra fase da pesquisa, 148 participantes divididos em grupos de oito e nove pessoas comeram as três amostras idênticas do chocolate selecionado no Laboratório de Serviços de Alimentação da FEA. Primeiro, sem qualquer som. Depois, ouvindo a música “doce” e em seguida a música “amarga”.
Os resultados das degustações finais mostraram que, embora as três amostras fossem idênticas (todas com 54,5% de cacau), a música “doce” influenciou positivamente na percepção do gosto doce, como se o alimento fosse mais adocicado. O experimento também indicou que a interação do chocolate com a música “doce” aumentou a intensidade das emoções positivas nas pessoas, enquanto a música “amarga” acentuou as emoções negativas.