Aqui menos também é mais

Estudo recente da consultoria de inteligência de mercado Mintel passou um pente-fino nos Hábitos de Consumo de Doces e Sobremesas dos brasileiros. Considerada como não essencial, a categoria sofre com a insegurança econômica do país, apesar da relativa estabilidade nos índices de inflação e desemprego emitindo sinais de arrefecimento, observa Naira Sato, diretora de categorias da Mintel. “Os principais desafios para a categoria estão relacionados a esse cenário econômico desfavorável e à tentativa do brasileiro em adotar hábitos alimentares mais saudáveis”, capta a executiva. Diante da insegurança econômica e política, complementa ela, os consumidores devem continuar controlando mais de perto os próprios gastos, comportamento que afeta diretamente itens considerados supérfluos, como é o caso dos doces e sobremesas. Na entrevista a seguir, Naira detalha a pesquisa do consumo de doces e assinala eventuais oportunidades ainda observadas na categoria.

Naira Sato, diretora da Mintel: é preciso encontrar formas de associar momentos de prazer e bem-estar emocional a produtos em opções menores com preços mais acessíveis.

DR – Qual o tamanho atual do apetite dos brasileiros por doces e sobremesas?
Naira – Cerca de 32% dos entrevistados afirmaram estar comendo menos doces e/ou sobremesas em geral; 26% dos consumidores de doces e/ou sobremesas afirmaram estar comendo menos doces e/ou sobremesas fora de casa; e16% dos consumidores disseram estar comendo marcas mais baratas de doces ou sobremesas.

DR – Quais as possíveis explicações para esses dados?
Naira – Em primeiro lugar, a preocupação com a saúde e o aumento dos casos de obesidade e diabetes são desafios a serem enfrentados pela categoria. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE – Brasil 2014), 60% da população adulta brasileira está obesa ou com excesso de peso. Além disso, de acordo com o Ministério da Saúde (MS), o número de brasileiros diagnosticados com diabetes cresceu 61,8% nos últimos 10 anos. Como se sabe, os consumidores frequentemente acusam produtos com alto teor de açúcar e carboidratos como os grandes responsáveis pelo sobrepeso e também como agravantes da diabetes. Isso impacta diretamente a categoria de doces e sobremesas. Assim, 30% dos entrevistados afirmaram “limito a quantidade de doces/sobremesas que consumo como parte de uma dieta saudável”; e 28% dos entrevistados disseram se preocupar “com a quantidade de açúcar em doces/ sobremesas”.

DR – Dentro desse cenário, onde estão as oportunidades para avanço da categoria?
Naira – Ainda assim existem oportunidades para a ampliação da categoria, seja incorporando opções mais saudáveis ou investindo em outras ocasiões de consumo como a de snacks. Mas sem nunca deixar de ter em mente que a indulgência e o sabor são os principais atributos que os consumidores esperam da categoria. A busca pela indulgência e bem-estar emocional devem ser vistas como oportunidades. Apesar da preocupação com a saúde física, os doces e sobremesas têm grande importância junto ao consumidor em termos de indulgência e bem-estar emocional. Sendo assim, investir em sabores indulgentes, comunicados como um micromomento de prazer e/ou relaxamento e que também permitam um maior controle da quantidade de consumo, pode ser uma boa estratégia para que a categoria se mantenha presente no dia a dia do consumidor brasileiro.
DR – Como essa busca pela indulgência e bem-estar emocional podem ser na prática convertidas em oportunidades para a categoria?
Naira – As marcas podem investir em embalagens menores ou em tamanhos menores dos produtos (as minis ou thins) como forma de permitir um maior controle da quantidade consumida. Podem ainda inserir produtos que tragam ingredientes relacionados à melhoria do humor, a exemplo de insumos reconhecidos como relaxantes. Ou produtos e marcas com uma comunicação que exalte a questão da melhoria do humor associada ao prazer do consumo de doces/sobremesas são oportunidades.

DR – Como a preocupação com a saúde pode impulsionar a presença de alternativas mais saudáveis dentro da categoria?
Naira – De acordo com a pesquisa, 34% dos entrevistados disseram estar comendo “alternativas mais saudáveis”, a exemplo de saladas de frutas, em vez de doces e sobremesas nos seis meses anteriores à realização da pesquisa. Além disso, 17% dos entrevistados disseram estar consumindo “mais doces/sobremesas feitos com ingredientes naturais”. Sendo assim, investir em alternativas mais saudáveis, contendo ingredientes naturais, pode ser uma oportunidade para a categoria como um todo.

DR – O tamanho reduzido da embalagem ou gramaturas menores também ajudam a impulsionar a categoria?
Naira – O consumo como lanchinho entre refeições pode ser oportunidade de expansão. De acordo com a pesquisa, 30% dos estudantes (Base: 1500 usuários de internet 16+) citaram “Mata a fome” como um fator de escolha de um doce/sobremesa em vez de outro. No relatório Mintel Hábitos de Consumo de Snacks – Fevereiro 2018, 23% dos estudantes afirmaram que “Não há quantidade suficiente de snacks com embalagens convenientes (ex. porção individual, embalagem abre e fecha)”. Sendo assim, existe a oportunidade de investir em doces/sobremesas que promovam uma maior sensação de saciedade, combinados a embalagens de fácil consumo, que possam ser facilmente transportadas e armazenadas em bolsas, mochilas e etc., posicionando-os para o consumo dos estudantes.

DR – Como a inovação vem sendo trabalhada na categoria?
Naira – O consumidor brasileiro demonstra interesse por doces/sobremesas de fácil consumo on the go e opções com benefícios funcionais/nutricionais. De acordo com a pesquisa, 29% dos entrevistados citaram “fácil de comer em movimento” como um fator de escolha de uma sobremesa/doce em vez de outra. Segundo a Base de Dados de Novos Produtos Globais (Mintel GNPD/Global New Products Database), apenas 1% dos lançamentos feitos nos últimos anos (entre 2015 e 2017) no Brasil se posicionaram como convenientes (“para uso/consumo em qualquer lugar”), havendo assim espaço para esse tipo de lançamentos.
DR – E com relação à busca dos brasileiros por opções de doces e sobremesas com benefícios funcionais/nutricionais?
Naira – De acordo com a pesquisa, 41% dos entrevistados teriam interesse em experimentar “doces e/ou sobremesas com benefícios nutricionais (ex. alto teor de proteína)”. Segundo dados do GNPD, o Brasil já é um dos países que mais lança doces e sobremesas funcionais ou nutricionais em relação ao total anual de lançamentos dentro da categoria. Apesar de ser um dos três países que mais lançaram produtos com benefícios funcionais/nutricionais, o volume de lançamentos desse tipo, em geral, ainda é baixo havendo espaço para inovar.

DR – Como as marcas devem trabalhar para assegurar o avanço do segmento?
Naira – As marcas e fabricantes de doces e sobremesas precisam encarar os desafios e as oportunidades da categoria sempre tendo em mente que a indulgência e o sabor são seus atributos essenciais. A categoria de doces/sobremesas tem dois principais desafios: lidar com a crescente preocupação do brasileiro com a saúde e encontrar formas de continuar participando do dia a dia desse consumidor que, ainda inseguro com a economia, continua controlando os gastos com produtos considerados não essenciais.
Diante desse cenário, a categoria, que tem na indulgência seu principal apelo junto ao consumidor, precisa encontrar formas de associar-se a momentos de prazer e à promoção do bem-estar emocional, ao mesmo tempo em que deve oferecer um maior controle da quantidade ingerida e opções mais acessíveis em termos de preço. ■

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