A calibragem nos rótulos

Com o encerramento em novembro passado da consulta pública sobre rotulagem nutricional de alimentos no país, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) avalia os resultados para iniciar os desdobramentos que irão consolidar o tipo a ser adotado pela indústria brasileira. Enquanto isso, no México, a crise nacional de obesidade é enfrentada exatamente com uma recente regulação nos rótulos dos alimentos. O país foi pioneiro ao adotar em 2014 a cobrança de impostos sobre os refrigerantes e lanches de má qualidade nutritiva. Agora os consumidores mexicanos irão se deparar com rótulos pretos impactantes nas embalagens de bebidas e alimentos processados, alertando para produtos que contenham “muito açúcar”, “muita gordura” ou “muitas calorias”, dentro da ofensiva do país para enfrentar uma das piores epidemias de obesidade e diabetes do mundo. O novo sistema de rotulagem obrigatória, que já passou pelo processo de aprovação dos órgãos supervisores e entra em vigor agora em março, também vai representar um adeus para vários personagens graciosos desenhados em embalagens para atrair crianças, como o tigre Tony, do Frosted Flakes (Kellogg’s); o leprechaun de Lucky Charms (General Mills); o coelho Trix e o tucano Sam, dos cereais matinais Fruit Loops, também vendidos pela Kellogg’s no Brasil. A exemplo do Chile, onde um sistema similar deu bons resultados, alguns produtos poderiam ter que usar vários rótulos. Um saco de batatinhas fritas ou um pacote de biscoitos, por exemplo, poderiam ter três: uma para muito sal ou açúcar, assim como outra para muitas calorias e uma terceira para muita gordura. Os rótulos vão ter como base o conteúdo a cada 100g. Uma garrafa de suco poderia vir com alertas sobre o conteúdo de açúcar e calorias. Também vão ser usadas recomendações separadas sobre o conteúdo de cafeína e de adoçantes artificiais. Grandes processadoras de alimentos que obtêm altos lucros no México – segunda maior economia da América Latina, líder mundial em consumo de refrigerantes e quinto maior mercado da Nestlé – já se preparam para a mudança. Associações setoriais podem tentar entrar com mandados judiciais ou até contestar o sistema sob os termos do Acordo de Livre Comércio da América do Norte (Nafta, na sigla em inglês) ou do sucessor, o acordo comercial entre México, EUA e Canadá (USCMA), argumentando que os rótulos são equivalentes a barreiras técnicas contra o comércio exterior. Pioneiro na adoção de impostos sobre os refrigerantes e lanches de má qualidade nutritiva, o México adota desde 2014 uma política repetida, com variações, no Reino Unido e Portugal. Ainda assim, a pesquisa mais recente de Nutrição e Saúde Nacional, feita pelo governo mexicano, mostra que os índices de diabetes, hipertensão e colesterol ainda estão subindo no país. Mais de 80% dos mexicanos, incluindo crianças entre um e quatro anos, tomam bebidas com açúcar, segundo a pesquisa. ■

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