Inovação e saudabilidade formam o pano de fundo das ações na indústria brasileira de candies. Mas a conversão desses pilares em linhas de guloseimas ainda se distancia das expectativas geradas no consumo. Pressionada, de um lado, pelo canal impulso e suas tentações indulgentes, a demanda de guloseimas vacila diante de tendências que acenam com promessas de bem-estar e benefícios à saúde. Tanto do ponto de vista dos produtos e suas formulações como da comunicação das marcas, as inovações e possibilidades funcionais são catalisadoras dos projetos em curso nas fábricas. Partindo nessa direção, a indústria de balas, drops e caramelos vem tentando superar a retranca que persiste no setor. O cenário atual mostra que as empresas do segmento, incluindo derivados como pastilhas, gomas e pirulitos, vem combatendo o desânimo nas vendas, com modernizações no parque industrial e, sobretudo, apostas em linhas de confeitos de maior valor. Essa transformação pode ser conferida em itens de qualidade hoje reconhecida pelo consumidor e custos e preços com boas margens tanto para a indústria como para o trade. “Mas os últimos três anos têm sido de relativa estabilidade em termos de volume, com destaque pontual para determinados itens, que sinalizam oportunidades ainda presentes no setor”, analisa Adriano Orso, gerente de marketing da Florestal Alimentos que, abrindo novas frentes, acaba de adquirir a operação da Chocolates Planalto, na Serra Gaúcha (ver à pág. 7). Para ele, a grande capilaridade na distribuição de guloseimas doces continua sendo ingrediente importante na manutenção de volumes. “Apesar dessa realidade, a Florestal acredita e trabalha para a melhora constante dos números, uma vez que o consumo per capita no Brasil ainda é relativamente baixo”, assinala ele.
De acordo com a Associação Brasileira da Indústria de Chocolates, Cacau, Amendoim, Balas e Derivados (Abicab) há três anos esse consumo era de 1,7 quilos/habitante/ano, referência mantida com a estabilização na produção e demanda aparente no período. O monitoramento da entidade mostra que, nos últimos seis anos, a produção de balas e candies (incluindo gomas de mascar) caiu de 440 mil toneladas (t) em 2012 para 382 mil t no último exercício. No mesmo período, o consumo aparente de 371 mil t diminuiu para 318 mil t. Menos afetadas até o ano passado, as exportações que bateram em 80 mil t em 2012 reduziram a marcha para 78 mil t em 2017 (ver quadro ‘Abicab’ à pág. 20). Os dados da Abicab revelam que a balança comercial de balas e gomas fechou o primeiro semestre de 2018 com um superávit de US$ 51,9 milhões. As exportações apresentaram uma leve queda de 10,50% comparado ao mesmo período de 2017. As importações por sua vez, caíram 28,65% no período em 2018 comparado com igual período de 2017.
A América do Norte foi o principal destino das exportações de candies nacionais nos primeiros seis meses do ano, totalizando US$ 19,3 milhões em divisas. Em seguida vêm os países do Mercosul com US$ 18,1 milhões. O terceiro maior mercado é a África com um total de US$ 11,8 milhões. As importações se mantiveram iguais ou tiveram uma leve queda em quase todas as regiões no mesmo período, com exceção da América do Norte, repassa a Abicab.
Avanço em valor
Se de um lado os volumes não se sustentam, de outro, a inserção de itens de maior valor agregado e formulações enquadradas em tendências de consumo da moda têm garantido o avanço em valor. Pente-fino da consultoria Euromonitor International no varejo brasileiro de balas e derivados indica que o setor saltou de um faturamento de R$ 7,636.9 bilhões há cinco anos para R$ 8,264.5 bilhões em 2017. Em volume, houve decréscimo de 308,8 mil toneladas (t), em 2012, para 259,8 mil t, no último exercício. Com base nesses dados, a instituição estima que o mercado mantenha um crescimento moderado nos próximos anos, totalizando vendas de R$ 8,375.4 bilhões em 2022, equivalentes a 250,9 mil t. (ver quadro à pág. 18).
Para Rosalina Vilela, diretora da Erlan, a demanda interna de balas e candies vem perdendo o vigor por conta da ressurreição de um fantasma que assolou o setor nas décadas de 1970 e 1980. “O mercado está novamente enveredando por uma guerra de preços”, assinala ela, lembrando que, no passado, com baixo valor unitário de itens como balas duras, inflação alta e polarização das vendas no atacado o setor viu suas margens se pulverizarem. ”Viramos indústrias de commodities, principalmente no quesito balas”, frisa a executiva que, seguindo tendência entre as principais marcas, vê oportunidade de mudança no mix de produtos indulgentes com formulações saudáveis. “No momento estamos abraçando todas essas correntes, envolvendo linhas de balas e caramelos, com ênfase na modalidade premium e inspiração no nosso Toffee Bombom, carro-chefe da empresa há 40 anos”, sublinha Rosalina.
Na Simas, o diretor Luiz Eduardo Simas reporta que, depois de anos de desequilíbrio na oferta e demanda de candies, o setor vinha desde 2017 recuperando o vigor nas negociações e margens. “Apesar de empatar volumes, fechamos o balanço do ano passado com 13% de alta em valor”, grifa o dirigente. Tudo ia bem, inclusive com as vendas embaladas no início deste ano, quando a eclosão da greve dos caminhoneiros, em maio, pôs tudo a perder, rememora Simas. Para ele, a distribuição e o comércio de candies se mantêm sensíveis a mudanças na economia e qualquer movimento abrupto, como a crise do diesel, é suficiente para travar o setor. No passado, lembra ele, foi a alta nos custos de matérias-primas básicas, como açúcar, glucose e embalagens, que desencadeou o desequilíbrio nos preços e o encolhimento no consumo. Agora, ele sustenta, são as indefinições na política e economia as responsáveis pelo freio na indústria.
Entre os fatores que contribuíram, mais recentemente, para a recuperação das vendas da Simas, Luiz Eduardo inclui o avanço das linhas de balas e pirulitos das marcas Sam’s e Cherry Pop, campeões do giro na empresa, no segmento de artigos para festa. “Introduzimos há cerca de dois anos a linha festa, com destaque para o confeito drageado Pipper em oito cores, e hoje essa especialidade já representa 15% da receita geral”, relata o executivo. Com portfólio completo de balas e confeitos, totalizando 220 SKUs (Stock Keeping Unit), a Simas opera há mais de 70 anos na cena de candies, exportando quase a metade da sua produção para mais de 30 destinos em todo o globo. Recém-saído da incubadora, a linha de balas de café puxa o cordão de novidades programadas para 2018. “Desenvolvemos um sabor mais intenso, com aroma mais natural”, sublinha Simas, estimando fechar o ano com uma produção igual ao do último exercício, porém com 5% a 7% de crescimento em valor.
Adriano Orso, da Florestal, argumenta que a oferta de produtos e o consumo locais acompanham as tendências mundiais, mas o avanço é relativamente lento. “Enquanto algumas categorias mostram aprimoramentos de forma mais evidente, outras ainda estão estacionadas e é claro que, nesse sentido, deve-se considerar limitações no que é possível aplicar e declarar nas formulações e embalagens de candies”, observa o gerente. Entre os desafios para o desenvolvimento de uma nova geração de candies se insere a corrente da redução do teor de açúcar nas linhas de balas e candies. Rosalina, da Erlan, avalia o crescente movimento em prol da redução de produtos açucarados ou até mesmo o banimento da venda de guloseimas e candies em escolas como uma realidade inexorável no futuro. Para ela, os consumidores estão cada vez mais preocupados com a saúde da família e os responsáveis pela decisão da compra tendem a aderir a apelos como esses. ”O mundo terá que mudar para esse novo mercado”, grifa a diretora.
Orso pondera que esse é um tema recorrente nos últimos anos e chama a atenção da indústria para enquadrar os itens do portfólio em um novo figurino. “Os doces à base de açúcar, no entanto, continuarão sendo prestigiados, apesar de possíveis transferências para outras opções”, considera. Para ele, a proibição da venda de balas e candies açucarados nas cantinas de escolas certamente terá reflexos no consumo e na receita. “A indústria terá que buscar alternativas e uma delas é intensificar o desenvolvimento de produtos sem açúcar”, ele exemplifica.
Carlos Speltri, gerente de marketing da Peccin, observa que o perfil dos consumidores está mudando e mesmo fãs de guloseimas doces estão se tornando gradativamente mais seletivos com relação às calorias que ingerem. “Há uma tendência em direção ao consumo com menos açúcar, mas sempre haverá espaço para itens que entreguem prazer e indulgência com qualidade”, reporta.
Na Fini, fabricante de balas de gelatina, marshmallows e regaliz, a gerente de produto Paula Prado relata que o acompanhamento da tendência de saudabilidade e das mudanças no comportamento do consumidor resultaram no desenvolvimento da linha Bem-Estar, sem açúcares, que alia praticidade e funcionalidade. Sua mais recente novidade, a bala de gelatina Fini Cálcio +Vit D, abocanhou a Fi Innovation Awards, principal premiação nacional de inovação da indústria de ingredientes, produtos e suplementos alimentícios da Food Ingredients South America (FiSA 2018) como o produto funcional mais inovador (ver à pág. 28). “A linha Bem-Estar conta com oito itens no portfólio a exemplo de balas de gelatina enriquecidas com ativos funcionais, chicle com xilitol que auxilia a inibir o crescimento de bactérias e cáries, e é comercializada exclusivamente nas principais redes de farmácias”, informa a executiva.
Inovação e diferenciação
Speltri, da Peccin, pontua que os dados do setor mostram estabilidade em alguns segmentos e queda em outros. “Em balas mastigáveis e pirulitos, categorias em que atuamos mais fortemente, não sentimos retração, provavelmente devido à estratégia de inovação e diferenciação que temos implementado”, sustenta o executivo. Para ele, tanto o trade como os consumidores buscam novidades e, para atender a essa expectativa, a Peccin precisa permanentemente surpreender com propostas diferentes. “O espaço para produtos mais básicos é cada vez menor”, sentencia.
Em balas mastigáveis, o foco vai para produtos de maior valor agregado, como as marcas Tribala e Frutomila, reconhecidas por seu refinamento e diferenciação. “Já em pirulitos somos um dos líderes na categoria, graças também a um mix amplo e completo”, observa Speltri, detalhando que a empresa atua com diversos formatos, pesos e tipos de recheio e é essa variedade de oferta que tem gerado bons resultados.
Orso, da Florestal, argumenta que ainda existem oportunidades para produtos que chamam a atenção no PDV e a chave é a oferta criativa de linhas e embalagens. Entre os itens trabalhados pela marca dentro dessa perspectiva ele inclui a linha de pirulitos planos de diversos formatos; os marshmallows, com formas, embalagens e atributos diferenciados e ainda os confeitos sem açúcar. Por conta dessa abordagem múltipla, a empresa não possui apenas um mas diversos carros-chefe, a exemplo das balas Brazilian Coffee, Balinha do Coração e Bala Canela, além dos pirulitos Flopito Coração e Picolé sob a marca Florestal. “Já com a grife Boavistense os destaques vão para as balas Sonhare, Banzé e para os pirulitos Pop Kiss e Pop Tattoo”, elenca Orso.
Quanto à oferta que acompanha tendências mundiais, Speltri comenta que já podem ser conferidos no país itens com apelo de saudabilidade e funcionalidade, que são as duas correntes mais fortes na ala de balas e candies. “Ainda encaramos como segmentos de nicho, mas definitivamente tendem a crescer e se consolidar”, diz. Outra tendência percebida em candies é a de sabores mais intensos e exóticos, acrescenta o gerente da Peccin. A empresa, por sinal, captou essa demanda quando lançou a linha Energy de confeitos com sabores que imitam bebida energética. “Fomos precursores dessa onda, com a linha Blong Energy de chicles e pirulitos e estamos agora estendendo o conceito ao filão de balas mastigáveis drageadas recheadas, com a marca Tribala Energy”, repassa o executivo.
Rosalina, da Erlan, ressalta que, apesar da guerra de preços, marcas com reconhecida qualidade e tradição ainda asseguram espaço no trade para exposição com preços e margens rentáveis exibindo linhas mais indulgentes. Nesse grupo, ela inclui a menta mastigável da Erlan, as balas duras recheadas de menta com chocolate e os pirulitos Napolitano e Pinta Língua, além da Toffee Bombom sabor Dark coberta com chocolate meio amargo ou a versão de chocolate branco. “Esses itens seguram vendas e, apesar dos eventos exógenos que enfrentamos no último ano, conseguimos superar a paradeira, mantendo o mesmo patamar de faturamento do exercício anterior”, grifa a dirigente, sem detalhar números.
Marketing e distribuição
Entre as ações nos planos de marketing e distribuição que ainda contribuem para alavancar as vendas de balas e candies, o gerente da Florestal sustenta que, depois de assegurar presença nos canais indiretos, campanhas e promoções para catalisar as vendas são fundamentais para a movimentação das marcas. “O arsenal de opções passa por estímulos promocionais, descontos pontuais, espaços extras, exposição adequada e merchandising, além de campanhas de incentivo às equipes de venda”, pormenoriza. As ações envolvendo mídias digitais são cada vez mais importantes e já fazem parte da rotina das empresas e das pessoas. “Ir ao encontro do consumidor em ambientes virtuais em que ele transita está se tornando cada vez mais comum”, percebe Orso.
Além de manter fanpages, as marcas Florestal e Boavitense atualizam o conteúdo através de postagens diversas, que mesclam produtos e ações, comerciais e sociais. “É uma forma de oxigenar as marcas e a imagem da empresa junto aos seguidores”, diz o executivo, observando que a utilização de influenciadores digitais também passou a fazer parte do rol dessas ações. Com diversas sacadas implementadas tanto no flanco da distribuição como no marketing, a Florestal registrou crescimento de 11% no faturamento do último ano em relação a 2016, repassa o executivo. No período dos últimos 18 meses, a empresa lançou 42 itens nas categorias de balas e pirulitos.
Na Peccin, Speltri situa que as vendas de balas ficaram estáveis, enquanto o segmento de pirulitos cravou avanço de 4% em 2017 em relação ao período anterior. Ele confirma que as ações envolvendo as mídias digitais são cada vez mais positivas e necessárias. “Usamos hoje nossas próprias redes sociais para criar conexão com o público e aumentar o conhecimento e envolvimento com nossas marcas”, informa. Esse trabalho, emenda, visa divulgar diferenciais, mostrar o mix e inserir as marcas no cotidiano da faixa de consumo (target). Marcas como Blong e Tribala já contam com altos índices de engajamento e reconhecimento, a ponto de a empresa receber constantemente sugestões de sabores e apresentações. “Aprendemos a ouvir e valorizar essas sugestões, chegando até a lançar produtos baseados nessas propostas”, grifa Speltri.
Andrea Köhler, gerente de marketing da Fini, assinala a conexão e interação entre as áreas de marketing, trade marketing, merchandising e vendas para não apenas assegurar a presença nos PDVs, mas também reforçar o posicionamento da marca ao consumidor. “O plano de marketing contribui integralmente para fortalecer a comunicação, distribuição, posicionamento e consequentemente contribuir para o aumento das vendas”, grifa a executiva. Para ela ações como parcerias com outras marcas, eventos e presença em diferentes canais de distribuição – como parques, cinemas, franquias, e-commerce –, somadas a campanhas de mídia, ações de relacionamento com influenciadores e imprensa, criação e geração de conteúdo são alguns exemplos de ações.
Andrea sustenta que o segmento de balas e candies exibe alto potencial para divulgação nas mídias digitais, mas requer que as marcas estejam ao lado dos consumidores acompanhando as suas mudanças, rotinas e comportamento. “O brasileiro ama e vive a internet e, segundo relatório da entidade We Are Social, já constitui a terceira nação no globo que passa mais tempo online”, frisa ela. Mas para aproveitar esse potencial, completa a gerente, é preciso desenvolver e gerar conteúdo, promover interações, fotos que valorizam e evidenciam os diferenciais do produto, trabalhar o relacionamento e proximidade ao consumidor, com linguagem típica da rede e rapidez para criar e promover as oportunidades que só o meio digital possibilita. “Temos como DNA da marca proporcionar boas surpresas ao consumidor e, no meio digital, não é diferente”, assinala a executiva. Além de contar histórias, a marca gera conteúdos relevantes e únicos, produz fotografias criativas com os produtos, conversa em memes e, para cada rede social, desenvolve uma linguagem diferente, completa Andrea.
Recentemente, relata ela, a Fini lançou uma campanha institucional online com o mote “Se abriu, sorriu, é Fini”, fazendo alusão às palavras que constantemente são reinventadas pelo público jovem, assim como os memes, gírias e emojis tendo como protagonista os próprios confeitos da marca. Utilizando cores vivas, ilustrações e uma música que dita o ritmo, o manifesto mostra as transformações dos vocabulários atuais. Também foram produzidos stories de situações cotidianas que podem ser melhores com a marca Fini e vídeos veiculados em carrossel, ferramenta do Instagram, em um período de dez semanas.
Além de todos esses recursos, Andrea considera que ainda existe espaço em desenvolvimentos para criações que despertem a atenção dos consumidores no PDV. “O segmento de candies sempre teve como forte aliado o apelo visual, tanto do produto, quanto das embalagens. Esta é e continuará sendo uma tendência para os doces”, arremata.•