Com afeto e sem açúcar

Onda saudável aliada a informação e tecnologia ampliam o consumo de adoçantes
Adoçante natural derivado de planta é referência de nutricionistas e médicos.

Destaque maior do desempenho da indústria de alimentos, cujo avanço ficou em torno de 1,5% em 2014, o setor de produtos saudáveis não para de crescer, incluindo confeitos e guloseimas diet/light, funcionais e orgânicos. A performance, estimada bem acima da média dos alimentos convencionais, evidencia o forte engajamento do consumo, catapultado pela quase eliminação de diferenças sensoriais entre itens regulares e especiais. Os preços dos produtos, melhorados pelo efeito da escala sobre os custos dos insumos, também contribui para o quadro positivo. Desde a última década, o acesso de milhões de consumidores elevou a produção de uma gama crescente de guloseimas, abrindo caminho para o enriquecimento das linhas como forma de agregar valor e aperfeiçoar a qualidade. Os itens enquadrados na nomenclatura “zero%”, “livre de” e “baixo teor “, bem como os que incorporam alegação de propriedade medicinal, ganharam posição prioritária ou estratégica no planejamento da indústria. A condição de produtos de nicho, para portadores de doenças ou distúrbios nutricionais, foi substituída por gôndolas inteiras direcionadas a esse consumo engajado na onda saudável. “O Brasil já exibe a quinta maior taxa de crescimento mundial nesse setor”, dimensiona Carlos Eduardo Gouvêa, presidente da Abiad (Associação Brasileira das Indústrias de Alimentos Para Fins Especiais e Congêneres). Dados da consultoria Euromonitor International, repassa ele, indicam que o país movimenta US$ 10 bilhões somente com as vendas de produtos nutracêuticos, segmento cujo crescimento deve alcançar aproximadamente 20% até 2017.
A oferta e demanda no filão de saúde e bem-estar avançam em várias frentes, nota Gouvêa. Acompanhamento da Euromonitor no segmento de alimentos enquadrados no filão de itens saudáveis (Good For You/GFY) mostra que as vendas no Brasil projetam avanço constante de 28% de 2010 a 2015. Já o giro de produtos diet/light, sem glúten, sem lactose, integrais, naturais e orgânicos cresceu 82% durante a última década, atingindo patamar de R$ 15 bilhões ao ano. “Conceitos como beleza e estética deixaram de ser a tônica predominante, como acontecia na década de 1990, com os produtos diet/light. Hoje, o conceito de saúde e bem-estar é muito mais presente, não apenas com os produtos mas também com estilo de vida”, sintetiza Gouvêa.
Para o dirigente, vários fatores têm influenciado essa mudança de hábitos. Ele, no entanto, considera como principal o aumento da conscientização sobre o real papel dos alimentos como instrumento de melhoria da qualidade de vida. A busca por mais saúde, longevidade e bem-estar é que tem motivado a mudança de visão também de outros atores do mercado. Os supermercados (e o varejo em geral), exemplifica Gouvêa, hoje dão muito mais importância a aspectos nutricionais dos produtos e aos benefícios, porque sabem que consumidores mais conscientes demandam produtos mais adequados para sua necessidade e anseios, além de serem fiéis. “A própria mídia nunca divulgou tantas informações sobre o tema, trazendo dados relevantes e estudos”, observa.
Essa receptividade às mudanças por parte do consumidor coincidiu com iniciativas recentes de organismos como a Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Ministério da Saúde (MS) e da própria indústria, com apoio de instituições de pesquisa como o Ital – Instituto de Tecnologia de Alimentos, para se buscar reduzir os teores de gorduras, sódio e açúcar nos produtos. “Mercados como o de guloseimas, chocolates e candies também acabam se alinhando com essas tendências, valorizando itens de conveniência que trazem algum benefício funcional”, sublinha o dirigente.

Baixos teores

Na garupa de iniciativas como essas, a indústria de insumos pavimenta a passarela pela qual prepara o desfile de novidades, principalmente em frentes como a de baixos teores de açúcar e/ou caloria zero. Na Ingredion, peso-pesado em soluções em ingredientes de origem natural, um dos focos se concentra na cena de adoçantes. “Trata-se de um mercado que ainda mostra forte potencial de crescimento no Brasil, impulsionado pela intensificação das preocupações de consumidores com a ingestão de açúcar. É uma tendência mundial que acelera o consumo do público focado em dietas restritivas ao açúcar ou preocupado com a estética e em manter hábitos alimentares saudáveis”, resume Mirella Gabriel, gerente de desenvolvimento de mercado Sweetness da corporação.
Entre as inovações bancadas pela Ingredion nesse compartimento, a executiva insere o sistema de doçura Dial-In Sweetness. Ele consiste na combinação única de dados, experiência e processamento que especialistas da companhia usam para auxiliar a indústria alimentícia a alcançar rapidamente o perfil de doçura e funcionalidade adequados. “O sistema ajuda a resolver os desafios de dulçor, seja por sabor, funcionalidade ou uma combinação de ambos, sendo que a Ingredion pode desenvolver formulações economizando tempo e custos, além de otimizar o perfil de dulçor do produto”, assinala Mirella. Entre os benefícios adicionais do Dial-In, ela acrescenta a redução e substituição de ingredientes sem interferência no sabor e na textura; a capacidade de usar o “teor calórico reduzido” sobre as propriedades nutricionais e a capacidade de igualar o produto em termos de sabor e textura “a um líder de mercado”, formulando um produto com valor calórico reduzido e com características de um produto tradicional.
“O sistema de doçura Dial-In foi desenvolvido para resolver os desafios de dulçor, sejam eles relacionados ao sabor ou características funcionais, para desenvolver formulações com perfil de doçura ideal e permitir a utilização legal de rotulagens como sugar free, teor reduzido de açúcar e sem adição de açúcar”, frisa a gerente. Além desse sistema, acrescenta ela, a Ingredion participa do mercado de adoçantes com um amplo portfólio de soluções versáteis em dulçor para múltiplas aplicações. Elas incluem ingredientes como polióis, dextroses, a Stevia Reb A e misturas de aspartame, sucralose e acessulfame K, além de blends especiais em sistemas de dulçor e textura. Quanto às aplicações, Mirella sugere um leque vasto que engloba desde produtos lácteos e sorvetes, bebidas, balas, confeitos e chocolates a itens de panificação, geleias e conservas, além de especialidades para dieta com restrição de açúcares, adoçantes de mesa e suplementos nutricionais. As principais aplicações da tecnologia de poliois em alimentos englobam confeitos isentos de açúcar, como balas (duras e mastigáveis), gomas de mascar e chocolate, bem como em biscoitos, pães, bebidas não alcoólicas, sorvetes, geleias e produtos lácteos, exemplifica a especialista.
“A indústria de bebidas não alcoólicas, que inclui mercados potencialmente explosivos como o de sucos prontos e refrescos em pó, é a categoria que mais tem utilizado os adoçantes naturais de alta intensidade nos lançamentos”, observa ela. O uso de adoçantes em versões reduzidas em açúcares de alimentos ou bebidas tem crescido ao longo desses últimos anos e as versões derivadas de plantas, como a estévia, devem fornecer o principal impulso para esse avanço no uso de adoçantes nos próximos anos. “Como os fabricantes trabalham para criar o perfil de sabor certo para o estévia e outros adoçantes derivados de plantas para obter aprovação das autoridades regulatórias, o mercado de adoçantes artificiais ainda oferece oportunidades de crescimento, em particular nos mercados da sucralose e acessulfame K”, sustenta a executiva.
No reduto dos adoçantes de alta intensidade, a Ingredion vem operando a introdução da marca Enliten. Adoçantes de alta intensidade são assim denominados devido ao seu potente poder de adoçamento e, portanto, utilizados em quantidades muito menores que as da sacarose. Com o Enliten, Rebaudiosídeo A de alta pureza, obtido a partir das folhas de estévia, a Ingredion propõe um adoçante de alta intensidade com um perfil diferenciado de sabor e dulçor. Segundo Mirella, o insumo exibe características únicas. Por ser obtido através de fonte natural, sem modificações químicas e ainda apresentar excelente sabor e estabilidade nos processos de produção, ele se enquadra como uma das mais atualizadas opções para a indústria. “Alimentação não balanceada, obesidade, hipertensão e doenças coronárias são preocupações que afetam diretamente um grande número de pessoas no mundo inteiro. Esse público procura reduzir o consumo de açúcares, gorduras, sal e calorias, entre outros, para alcançar uma vida mais saudável. Os alimentos com redução de açúcares, diet/light, cada vez mais fazem parte do cardápio dos consumidores, aumentando a demanda por edulcorantes de excelente sabor com apelo natural”, conclui a gerente.

Frequência de consumo
No campo dos adoçantes de mesa, a indústria paranaense Lightsweet sobressai com as marcas Lowçucar e Magro, sendo esta última a terceira mais vendida no país, informa Adriana Mary de Paula, gerente de marketing da empresa. Movimentado por poucos fornecedores, esse mercado é liderado pela Hypermarcas, dona da grife Zero-Cal, seguida pela Linea Sucralose, detentora da marca Linea, repassa a executiva. “A exemplo do reduto de ingredientes com teor zero ou reduzido de açúcar, o filão de adoçantes de mesa mantém firme crescimento por basicamente três fatores: a conscientização dos malefícios do consumo exagerado do açúcar; o aumento da diabetes no país e no mundo e a valorização da boa forma e bem-estar”, sustenta a gerente.
Entre as desbravadoras do filão de adoçantes, com um dos maiores portfólios do segmento, a Lightsweet espreita um consumidor que, segundo Adriana, adquire uma embalagem de adoçante em pó uma vez por mês. “Já a versão líquida é comprada uma vez a cada 45 dias, mostrando que a segmentação de marcas em frascos e sachês também facilita a escolha do consumidor”, observa. Para a especialista, edulcorantes naturais como a stevia exibem maior potencial de crescimento pelo apelo natural somado à aceitação pelos profissionais da saúde, sendo esse o produto de melhor custo/benefício. “Entre os adoçantes de maior penetração no momento sobressaem a stevia, mais indicados por médicos e nutricionistas e os à base de sucralose, derivado da cana-de-açúcar com zero caloria e sabor mais próximo da sacarose”, sublinha Adriana.
A Lightsweet opera há 25 anos na produção de alimentos que minimizam o consumo de açúcares, carboidratos e gorduras, ostentando ainda no portfólio linhas especiais para a redução ou eliminação de glúten e lactose. “O que fazemos não é indicar ao consumidor a eliminação dos diversos componentes prejudiciais encontrados nos alimentos, mas reduzir o que for possível à sua ingestão. Dessa forma, ele pode ter uma vida mais confortável na medida em que minimiza o stress de consumir ou não esse ou aquele componente”, argumenta Amaury César Cruz Couto, presidente da Lightsweet, que também opera a marca SóStevia. Formado em Engenharia Química pela Universidade Estadual de Maringá (UEM), onde foi docente por 15 anos, o empresário avalia que o consumo de alimentos mudou drasticamente nos últimos 20 anos.
A própria legislação, nota ele, se tornou mais flexível para produtos das diversas categorias. As pessoas estão mais conscientes e associando bons hábitos alimentares com a sua saúde. Apesar de todo o avanço verificado, ainda existe uma parcela da população que não mudou em quase nada os seus hábitos alimentares, percebe. Para Couto, muitas descobertas aconteceram e influenciam os produtos nos dias de hoje e um fator importante é a presença de grande contingente de profissionais na área de nutrição. “Foi decisiva para essas mudanças a descoberta dos malefícios da gordura trans presente na maioria dos alimentos industrializados. Em paralelo, deu-se o início da consciência popular sobre os males causados pelos alimentos ricos em açúcar, sal e gorduras. As doenças relacionadas aos maus hábitos alimentares estão sensibilizando as pessoas para uma ação contrária e vários são os negócios que estão nascendo voltados à alimentação mais saudável”, assinala o dirigente.
Também a mídia, acrescenta ele, se posiciona sobre o tema com maior frequência. As pessoas no mundo todo, argumenta o diretor da Lightsweet, estão ficando obesas pelas características da vida moderna. Há 20 anos, as condições sócio-econômicas eram muito diferentes e, por consequência, os gastos calóricos eram maiores. “Atualmente, podemos perceber que o consumidor está mais atento às informações sobre os nutrientes nos produtos. Os do tipo diet e light estão em evidência assim como os orgânicos e, praticamente, acabam de nascer os alimentos com apelos funcionais”, grifa Couto. Em paralelo, emenda ele, a legislação atual é mais flexível, permitindo o surgimento de alimentos próprios para o consumo atual, com menos calorias, mais nutrientes e mais funcionalidades.
O presidente da Lightsweet considera que o mercado de uma maneira geral segue tendências e o de alimentos não foge à regra. Há 20 anos, relembra, esse panorama era muito inóspito e, no entanto, nascia no Brasil a chamada terceira onda dos alimentos, que inclui os tipos diet e light, até 1988 proibidos de fabricação por força legal. A indústria se sentiu em um momento próprio para desenvolver produtos para esse mercado, embora por motivos técnicos e mercadológicos essas iniciativas tenham sido tímidas no início. “Somente nos últimos 10 anos é que vemos muitos trabalhos interessantes, voltados para a melhoria da qualidade nutricional nos alimentos, envolvendo as calorias, sódio, glúten, açúcar, gorduras e outras benesses”, afirma. Nos dias de hoje, conclui, percebe-se que a indústria está mais sensibilizada a várias iniciativas, observando as carências dos consumidores de uma maneira geral e responsável e mais propensa a iniciar um trabalho de oferta de itens para melhorar as condições nutricionais de todos. •

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