Show no mercado funcional
Apesar do baixo consumo per capita no país, estimado em 2,8 quilos/habitante/ano, a indústria nacional de chocolate ocupa posição de relevância entre os produtores globais. Com produção na faixa de 700-800 mil toneladas anuais, o Brasil é o terceiro produtor mundial, atrás dos Estados Unidos e Alemanha. Por mais de dez anos, o país se manteve na quinta colocação, com produção e consumo de chocolate estabilizados. Mas desde 2007 o setor mantém o atual posto de destaque no ranking global. Para se ter uma ideia do significado dessa condição, a subsidiária brasileira da Mondelez, dona da Lacta e uma das líderes do setor de chocolate no país, é a quarta maior operação global da companhia.
Próximo ao limite de sua capacidade desde meados da década passada, o setor chocolateiro vinha bombando até 2012. As mudanças em curso nos hábitos de consumo, com os conceitos de saúde e bem-estar em pauta na preferência do consumidor, certamente pesaram na construção desse quadro. A partir daí, no entanto, a demanda começou a sinalizar algum grau de saturação. Segundo dados da Abicab (Associação Brasileira da Indústria de Cacau, Chocolate, Amendoim, Balas e Derivados), a produção de chocolate (incluindo achocolatado em pó) em 2014 ficou em 781 mil toneladas (t), 3,7% menor que a do ano anterior. Com consumo aparente de 775 mil t, volume 3,2% abaixo do exercício precedente, o setor registrou exportações de 29 mil t contra importações de 23 mil t em 2014. Enquanto os embarques assinalaram queda de 3,5%, as importações de chocolate cravaram alta de 17,8%, contabiliza a Abicab (ver quadro ao lado). Já no balcão do varejo, o setor movimentou vendas de US$ 5,53 bilhões no último exercício, capta a Euromonitor International. Pelas planilhas da consultoria, há cinco anos elas totalizaram de US$ 3,58 bilhões e, conforme projeção da empresa, o setor deve alcançar em 2019 faturamento de US$ 7,48 bilhões.
A agitação em torno da produção, venda e consumo de chocolate no Brasil, entretanto, não tem precedentes em toda trajetória da categoria. De vilão da alimentação sadia, o chocolate virou a surpreendente coqueluche do ramo funcional, entrando na lista dos alimentos que comprovadamente trazem benefício à saúde. A tiracolo dessas constatações, proliferam avanços tecnológicos e empreendimentos, tanto do lado do fornecimento como da venda ao varejo. Em suporte a essa onda, também se multiplicam eventos como workshops, congressos e feiras. Entre os exemplos recentes, foi promovido na Bahia, estado que produz 70% do cacau plantado no país, o 7.º Festival Internacional de Chocolate, evento realizado em junho na cidade de Ilhéus (BA). Cerca de 50 expositores, sendo a metade formada por produtores de chocolate premium, elaborado com cacau fino e/ou de origem, recepcionaram mais de 25 mil visitantes. No ano passado, a terceira edição bienal da Feira Brasileira do Mercado de Chocolate (Febrachoco), promovida na cidade serrana de Gramado (RS), foi dedicada a uma agenda de negócios para todos os segmentos do chocolate, inclusas rodadas entre empresários do Brasil e do exterior.
Mesmo com a constatação da estabilidade na demanda, a indústria brasileira de chocolate segue bancando investimentos como o do grupo gaúcho Vonpar. Ao ingressar no filão alimentício há cerca de 2,5 anos, ele aportou cerca de R$ 160 milhões na integração das operações e expansão da linha de chocolates da gaúcha Neugebauer, hoje sob seu controle. Fundada em 1891, a mais antiga indústria de chocolate do país foi desativada em 2013. Em paralelo, uma fábrica nova foi instalada. Ela interliga a estrutura já existente da divisão de balas e pirulitos. O principal objetivo é transformar a Neugebauer em marca realmente nacional. Atualmente, as suas vendas estão concentradas no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina. O projeto da planta de chocolate segue o figurino das mais modernas instalações para processamento de cacau em todo o mundo. Ela reúne maquinário de procedência europeia, devendo elevar a capacidade atual em cerca de 200%. A Vonpar pretende triplicar os volumes de produção e, desde 2014, a capacidade total da unidade está entre 2 mil t e 3 mil t/mês de diferentes tipos de produtos (barras, confeitos e bombons), o triplo da antiga planta.
Já o investimento anunciado pela Ferrero de R$ 200 milhões na ampliação de sua fábrica em Poços de Caldas (MG) foi o maior aporte do grupo italiano no país, desde a inauguração da unidade há 20 anos, além de maior injeção de recursos programada para o biênio 2014/2015 nas subsidiárias da companhia pelo mundo. O investimento vai permitir à empresa produzir os chocolates Kinder, deixando de importá-los da Itália, além da pastilha Tic-Tac, também prevista para iniciar a produção no país. Até hoje, somente a pasta de avelã Nutella e o bombom Ferrero Rocher eram produzidos na fábrica mineira. No limite de sua capacidade, a produção de Nutella vai dobrar, saltando para 10 milhões de quilos. Com relação ao ao bombom, carro-chefe da marca, a mudança será sobretudo na qualidade. Assim, a linha Rocher brasileira se iguala à produção do confeito original na Itália. Além da duplicação da fábrica, a companhia instalou um centro de distribuição (CD) no mesmo local.
Posicionada entre os principais supridores de cobertura (chocolate industrial) do país, a Harald também investiu cerca de R$ 30 milhões para expandir sua atuação no mercado premium. O projeto incluiu a instalação de uma segunda unidade em Marília (SP). Sediada em Santana de Parnaíba (SP), a empresa opera no filão de coberturas com a marca Melken, fornecida a indústrias de alimentos, padarias, confeitarias e sorveterias. Ao inserir a grife Unique, que consumiu dois anos de pesquisas, a Harald ingressou no chamado mercado premium ou de chocolate fino. Mas ela vinha operando no limite de sua capacidade para atender a demanda crescente do mercado chocolateiro nacional. Às vésperas da Páscoa de 2015, lançou sua linha de chocolate com custo similar ao de uma cobertura. Apesar da aprovação total da clientela, a empresa teve de contingenciar a distribuição da novidade por ocupação total de sua capacidade de produção.
Gargalos como este deverão ser superados com a fusão anunciada em abril último com a japonesa Fuji Oil, uma das maiores fabricantes globais de gorduras especiais, cremes vegetais, proteína de soja e derivados de cacau. A processadora de óleos, que já era fornecedora da Harald, investiu cerca de R$ 640 milhões (24 bilhões de ienes) por 83% do capital da Harald. A Fuji já atuava no mercado brasileiro na área de óleos e gorduras comestíveis e, com essa transação, expande sua presença para o segmento de chocolates, no qual já opera em outros países. •
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