Potencial para bons negócios
A exemplo do que ocorreu na última década nos EUA, os últimos dois anos no Brasil têm assistido o florescimento dos negócios de chocolate no segmento do grão de cacau ao chocolate pronto para consumo (bean-to-bar, em inglês). Ele já contabiliza mais de 40 empresas de produção artesanal, com controle da amêndoa à barra.
No bilionário mercado norte-americano de chocolate, que movimenta cerca de US$ 20 bilhões anuais, estima-se que as cem principais empresas do bean-to-bar faturem anualmente US$100 milhões. Ainda que os números brasileiros sejam mais modestos que os norte-americanos, as perspectivas de expansão têm animado seus players e despertado o interesse de estudiosos do setor.
Já reunidos numa associação, os produtores artesanais de chocolate de diferentes estados do país trocam experiências e compartilham planos, constituindo uma importante rede de conhecimento que muito pode favorecer o segmento em seu processo de legitimação.
Um dos desafios de cada produtor é encontrar a escala adequada de produção que garanta a manutenção de processos artesanais necessários para a caracterização deste tipo de chocolate. Esses produtores enfrentam uma dupla missão: oferecer ao mercado um produto de alta qualidade e, ao mesmo tempo, educar os consumidores para a experiência sensorial de apreciar um bom chocolate. Como acontece com apreciadores de outras categorias como a cerveja, o café e, mais conhecidamente, o vinho, uma mudança na forma de consumir estes produtos passa a envolver um universo de informações como a origem das matérias-primas, suas variedades e manejos e até mesmo uma dimensão ética com relação à sustentabilidade socioambiental de seus processos.
Ainda quanto à escala da produção no segmento bean-to-bar, é importante notar que a padronização de processos é importante para a garantia da qualidade do produto final. Ao mesmo tempo, ela não pode eliminar aquilo que é próprio de um produto artesanal: a valorização das particularidades de cada matéria-prima, da origem de produto, de cada variedade do cacau, da safra do fruto e de seus processos. Diferentemente do produto industrial, que exalta a segurança de uma experiência degustativa sempre igual, o produto artesanal pode proporcionar ao consumidor uma experiência sempre prazerosamente nova. É o estímulo da descoberta, do novo e não do mesmo.
Entre os membros da Associação Bean-to-Bar Brasil o volume de produção de chocolate varia de 150 quilos mensais a 80 toneladas.
Em recente conversa com um dos membros da associação, pude observar além de seu profissionalismo e caráter empreendedor, seu entusiasmo com as descobertas de novos frutos/fornecedores através de viagens de trabalho por diferentes países, além do reconhecimento de potencialidades do setor cacaueiro e de chocolate no Brasil ainda não exploradas. Tendo planos de triplicar sua produção nos próximos anos, o mencionado produtor relatou em conversa informal os cuidados que vem tendo com seus contratos de fornecimento. Cotejado por respeitados varejistas, tem evitado colocar seu produto em prateleiras em que ficará perdido entre produtos industrializados. O segmento bean-to-bar tem constituído um certo ecossistema que vai dos produtores das matérias-primas aos distribuidores do produto final.
Embora haja estimativas, não há no momento condições para dimensionar o teto de crescimento para a produção do cacau fino no Brasil e, por extensão, para o segmento bean-to-bar. O desenvolvimento do segmento é dependente, dentre outros fatores, da coordenação entre os agentes na cadeia produtiva do cacau. Entretanto, no que tange à identificação de demandas, conquista do interesse do consumidor e o desenvolvimento de marcas e canais de distribuição, o segmento tem evoluído e dado mostras disto com sua participação num número crescente de feiras e demais eventos do setor, inclusive acumulando premiações.
Se voltarmos por um instante o olhar para um século atrás, quando uma marca de chocolate fez seu primeiro anúncio luminoso em São Paulo e, ao longo do século 20, criou um mercado e moldou o paladar do consumidor brasileiro de chocolate, perceberemos que o que vem ocorrendo no presente é só o começo de um processo com potencial para muitas mudanças, e bons negócios. ■
Arnaldo Francisco Cardoso é professor e pesquisador da Universidade Presbiteriana Mackenzie, campus Higienópolis e Alphaville. Atua nas áreas de Economia, Comércio Exterior e Inteligência de Negócios.
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