Com público esperado na faixa acima de 30 mil visitantes, a convenção anual do setor atacadista distribuidor, promovida no início de agosto em São Paulo (SP), encerrou a sua 36ª edição com saldo positivo, apesar da crise econômica do país. Promovido em paralelo ao Enacab – Encontro Nacional da Cadeia do Abastecimento, o evento atraiu mais de 150 fornecedores de produtos, serviços e equipamentos que recepcionaram uma clientela qualificada durante os quatro dias de exposição, no São Paulo Exhibition & Convention Center (antigo Centro de Exposições Imigrantes). Segundo a Abad (Associação Brasileira de Atacadistas e Distribuidores), patrocinadora da feira e convenção, a movimentação refletiu as expectativas da entidade para o segundo semestre. “Mostrou a confiança do setor mesmo diante de um cenário difícil e desafiador”, resume José do Egito Frota Lopes Filho, presidente da entidade.
Segundo ele, o pequeno e médio varejo, principais clientes dos agentes de distribuição, enfrentam um difícil cenário. Pressionado por juros altos, inflação e desemprego, o consumidor tem sido implacável na hora da compra: leva menos produtos, busca as melhores ofertas e escolhe o estabelecimento segundo critérios específicos, como localização, infraestrutura e, principalmente, preços menores. “Esse ambiente hostil preocupa e o pequeno varejista se vê diante de duas alternativas: encolher e correr o risco de fechar a loja ou lutar pela sobrevivência”, observa Lopes Filho.
Foi pensando nesse varejista que a Abad mudou o foco do seu evento em 2016. Assim, pela primeira vez, São Paulo foi a sede do maior encontro da cadeia de abastecimento do chamado canal indireto. Representantes da indústria, agentes de distribuição e varejistas tiveram três dias de imersão – com capacitação, informação e relacionamento – para, juntos, tentarem gerar oportunidades de negócios e encontrar caminhos para driblar a queda de consumo. Segundo a Abad, os números ainda não foram fechados, mas a expectativa é alcançar mais de R$ 20 bilhões em negócios.
Para Lopes Filho, o atual ritmo de crescimento econômico e os novos hábitos de consumo desenham tendências e sinalizam desafios. A Abad, segue ele, representa os agentes de distribuição que, por sua vez, atendem mais de 1 milhão de varejistas. É, portanto, dever da entidade coordenar o desenvolvimento socioeconômico da cadeia de abastecimento do canal indireto, que inclui também a indústria.
Durante a feira, os varejistas puderam visitar uma loja modelo completa, da recepção de produtos do fornecedor na retaguarda até a consumação da venda pelo caixa. O objetivo, ao simular o dia a dia de um estabelecimento, foi atualizar o varejista, mostrando como adotar boas práticas e garantir maior rentabilidade, mesmo em um espaço de pequenas dimensões. Ao lado da loja modelo, tanto o varejista como o distribuidor também tiveram a oportunidade de conhecer o centro de distribuição do futuro. Montado com o apoio da indústria, o CD apresentou toda a logística de distribuição e armazenamento, seguindo padrões hightech.
Inflação declinante
De acordo com o banco de dados da Abad, o setor atacadista e distribuidor apresentou em abril último queda real (deflacionada) de 1,15% em relação ao mesmo mês do ano passado. O índice foi menor do que o recuo registrado em março, de -1,72%. No acumulado do ano, a redução foi de -0,59% e, na comparação com março, a queda ficou em 8,55%. Já em termos nominais, houve crescimento de 8,02% frente a abril de 2015 e de 9,28% no acumulado de janeiro a abril, comparado ao mesmo período do ano passado. Em relação a março, houve queda real de 8%. No relatório da entidade, o dado positivo é que o ritmo de queda diminuiu com tendência à estabilidade no primeiro semestre, em termos reais, contrariando, inclusive, os prognósticos da Abad no início do ano.
Para o segundo semestre, a entidade espera alguma melhora, já que a base de comparação de 2015 é fraca e outros fatores, como os resultados preliminares do Enacab, apontam para um cenário mais otimista. “A inflação deve começar a ceder, já que, com o desemprego em alta e consumo em queda na maior parte do país, os índices atuais não devem se sustentar por muito tempo”, acalenta Lopes Filho. Com isso, avalia ele, a confiança do consumidor deve voltar aos poucos e ajudar a aquecer a demanda até o fim do ano. Por outro lado, com os bons resultados das exportações agrícolas, a economia das regiões produtoras tende a reagir e gerar mais renda e consumo.
O fator político, contudo, continua a influir no âmbito econômico, e a retomada efetiva da confiança depende do sucesso do governo interino de Michel Temer nas ações focadas na estabilização do país, considera o dirigente. “O mercado ainda está bastante incerto e assim permanecerá enquanto a situação política não se normalizar, e o governo não sinalizar com firmeza os avanços na condução da política econômica”, pondera. Para ele, contudo, como as empresas do setor já vinham se preparando para atravessar mais um ano cheio de desafios, a meta de pelo menos reverter o resultado negativo de 2015 (queda real de 6,8%) será possível, caso ocorra a retomada da confiança do consumidor.
Pleito atendido
Para o setor de confeitos (confectionery), a mostra perdeu fôlego nos últimos anos. Desde 2014, ela já não contava com a montagem paralela da Sweet Brasil International Expo, maior plataforma de lançamentos da indústria de chocolates, biscoitos e candies do país. Patrocinada pela Abicab (Associação Brasileira da Indústria de Cacau, Chocolate, Amendoim, Balas e Derivados), ela era montada simultaneamente à tradicional feira da Abad – atual Enacab – desde 2002, quando as duas entidades costuraram uma aliança entre o setor de guloseimas e o seu canal de vendas por excelência. “O evento da Abad já vinha fragilizado nos últimos anos, principalmente pelo caráter itinerante que onera os custos dos expositores, culminando com a participação de cerca de 20 indústrias do setor na presente mostra, número que já superou a casa de 50 empresas”, analisa Alexandre Heineck, diretor comercial da gaúcha Docile.
Desde a sua criação, a realização da feira do atacado distribuidor se revezava, com exceções pontuais, entre Curitiba (PR) e capitais do Nordeste. Heineck observa que um dos pleitos dos expositores do setor de confectionery era trazer o evento para São Paulo. “Nesse sentido, parece que fomos atendidos, com a feira programada este ano para a capital paulista. A expectativa é que ela se fixe, pois trata-se do maior centro consumidor do país, principal alvo da maioria das empresas”, assinala o executivo. Com o rompimento da Sweet Brasil em 2014, o contingente de indústrias da ala doceira que, no passado, chegou a abocanhar 20-25% do total de participantes do evento caiu drasticamente. “Das nove indústrias do setor no Rio Grande do Sul, só estiveram presentes três na última edição da Abad”, nota o dirigente da Docile, que alinhou sua empresa este ano ao lado das também gaúchas Florestal e Neugebauer (grupo Vonpar). Apesar desse enfraquecimento, Heineck reconhece a importância do principal evento do setor atacadista.
Produção certificada
Na Florestal, a expectativa em relação ao evento já era bastante positiva, com a mudança para São Paulo. Para Adriano Orso, gerente de marketing da indústria de candies, além da aguardada vinda para o maior centro consumidor do país, a realização da feira às portas do segundo semestre sempre renova a expectativa de uma retomada no setor. Com 32 itens lançados em 2015 em nove categorias e outras 14 novidades disparadas até agora em 2016, a Florestal aproveitou o Enacab para comunicar uma importante conquista. Orso relata que a empresa comprova sua qualidade e compromisso com o meio ambiente, anualmente, através de auditorias externas. Em junho passado, a Florestal teve os sistemas de gestão da qualidade e ambiental submetidos à auditoria da empresa SGS. Por conta disso, a companhia recebeu certificado de atendimento aos requisitos legais exigidos nas normas ISO 9001 e ISO 14001. Orso ressalta que a Florestal Alimentos S/A foi a primeira empresa brasileira de doces a conquistar a certificação ISO 9001, em janeiro de 1997.
Nesses 19 anos, a empresa cresceu e melhorou continuamente seu sistema de gestão, com foco na qualidade e na melhoria contínua dos produtos e processos, relembra o gerente. Em agosto de 2002, conquistou a ISO 14001, graças ao sistema de gestão ambiental. Em novembro de 2013, foi certificada em Boas Práticas de Fabricação (GMP/Good Manufacturing Pratices), comprovando adequação do processo às orientações do Codex Alimentarius, fórum internacional de normatização do comércio de alimentos.
Investimento alto
Para a Simas Industrial, uma das maiores exportadoras de candies do país, o encontro anual de atacadistas e distribuidores é uma das principais ações para incremento das vendas no mercado interno. “Por isso, participamos de todas as edições da feira paralela à convenção, pois seu maior trunfo é concentrar os principais players do setor num mesmo lugar”, sublinha Luiz Eduardo Simas, diretor de marketing da indústria potiguar. Apesar de considerar essa participação importante para os negócios, o executivo se queixa do alto custo do investimento que, aliás, não é exclusividade do Enacab. “É bastante elevado o aporte feito em quatro dias de evento; nem sempre vemos o retorno. Se existisse incentivo por parte dos governos, a participação das indústrias seria bem maior”, sugere o diretor da Simas.
Ele argumenta que, apesar da estagnação da economia nos primeiros meses do ano, a empresa continua operando forte nos mercados em que atua. “Fizemos lançamentos no início do ano dentro da linha Cherry Pop, destacada na feira, investimos em promoções no PDV e nas equipes de vendas, aumentando a atuação nos mercados do Sul e da América do Sul, onde não tínhamos participação ainda”, informa. Sem citar números, ele confirma que a Simas conseguiu elevar os volumes de vendas em relação ao ano anterior. Como já é praxe, o segundo semestre ser melhor que o primeiro, a empresa segue bancando os investimentos necessários para manter o mercado aquecido, entre os quais Luiz Eduardo encaixa mais essa participação no Enacab. “Não podemos deixar que a crise guie nossos negócios, temos que fazer exatamente o contrário e tirar dela o melhor proveito”, frisa o dirigente. Ainda longe de recuperar as vendas do passado, ele credita a difícil conjuntura às muitas mudanças ao longo dos anos e não apenas à crise político-econômica atual. “O maior desafio agora é o aumento de custos (fixos e variáveis), que forçou alguns reajustes de preços durante os primeiros meses do ano, prejudicando o crescimento que havíamos planejado. Mas a expectativa, com a feira da Abad, é manter o avanço alcançado até o momento”, grifa Simas.
Tapioca turbinada
Pela segunda vez no evento, a Casa Maní seguiu para o Enacab com a expectativa de que os distribuidores e atacadistas fornecedores das redes de supermercados independentes escancarassem as portas para a sua linha de produtos. “Viemos em busca de um aumento de 20% nas vendas”, crava Antonio Fadel, diretor geral da empresa que, há 40 anos, atua na produção de alimentos à base da mandioca. A novidade preparada pela empresa para o evento é a nova linha de barrinhas de tapioca Tapiocando a Fome, disponíveis em quatro versões de sabores (banana, banana com chocolate, morango com chocolate e castanha com chocolate). Produzidas 100% à base de tapioca, elas são uma exclusividade da Casa Maní e sobem às prateleiras como opção prática para tapear a fome. “A apresentação no Enacab foi fundamental para aumentar nossa atuação no varejo de todo o país”, considera Fadel, ainda sem quantificar a participação na feira. Para ele, ampliar a presença no mercado, apostando nos diferenciais da linha, foi o principal objetivo, além de oferecer suporte a clientes novos cadastrados no estande da empresa.
Outro destaque, frisa Fadel, foi a apresentação da rede de franquia Estação Tapiocando, com diversas opções de negócios. Além do quiosque de 9 metros quadrados, que chamou a atenção, evidenciando ser uma boa saída para momento de crise, a Casa Maní detalhou projetos para abertura de lojas, acima de 30 metros quadrados. Também foram apresentadas em primeira mão as embalagens para as massas de tapioca Tapiocando a Vida, cujos meandros da manufatura são o seu principal diferencial. “Passa por um processo de armazenamento a vácuo, totalmente automatizado, que permite retirar todo o ar da embalagem, aumentando o prazo de validade sem alterar características de aroma e sabor”, explica o diretor geral. Além disso, completa ele, a embalagem a vácuo evita a desidratação superficial do produto, mantendo a umidade necessária para o preparo, sem o risco de contaminação por bactérias. Também enfeitou a vitrine da Casa Maní no Enacab o pote para guardar massa embalada no formato travesseiro (pillowpack) após a abertura, que torna o armazenamento da tapioca mais prático e seguro.
Segundo Fadel, o consumo nacional de tapioca em suas várias opções de consumo é estimado em 50 mil toneladas para 2016. A Casa Maní opera uma capacidade de produção de 12 mil t/a de massa de tapioca e, atualmente, comercializa 350 t/mês. No último ano, a empresa investiu R$ 10 milhões no desenvolvimento das massas e hoje exibe a fatia de 15% no mercado de tapioca.•