O pior já passou
Dois anos seguidos de recessão acabaram impactando a trajetória da indústria brasileira de chocolates, biscoitos e confeitos (confectionery) em pleno voo de cruzeiro. Apesar das manobras para segurar metas de produção e vendas, o setor precisou redimensionar a oferta em função da retração na demanda, registrando uma desaceleração que atravessou 2015 e 2016 até a primeira metade de 2017, quando o mercado voltou a sinalizar pulso. Com PIB (Produto Interno Bruto) na faixa de -3% nesse período, o desempenho do setor nacional de confectionery sucumbiu às previsões de baixa. Alguns nichos pontuais, no entanto, alcançaram e mantiveram um certo avanço. Entre os exemplos, incluem-se os segmentos de chocolates, biscoitos e candies especiais, funcionais ou de apelo indulgente, de maior valor e preço final, desdobrados das macrotendências globais de nutrição e alimentos.
O consumo viabilizado pela melhora no poder aquisitivo, fruto da política econômica implementada em duas décadas, seguiu sendo o principal combustível da demanda de chocolates e candies até se exaurir com o aprofundamento da recessão. Com produção e vendas declinantes em 2014 e 2015, o setor de confectionery não conseguiu estabilizar a demanda geral no exercício seguinte, consolidando a queda com o índice mais baixo dos últimos cinco anos, à exceção da ala de balas e candies que cravou variação positiva de 1,3% em 2016 em relação ao exercício anterior. Um sopro favorável bafejou o primeiro semestre de 2017, com variação positiva (8,8%) no consumo aparente de chocolates e avanço (8,1%) nas exportações de candies, confirmam os dados da Associação Brasileira da Indústria de Chocolate, Cacau, Amendoim, Balas e Derivados (Abicab).
Implementada ao longo das últimas duas décadas, a melhora na renda e consolidação de classes emergentes chegou a revitalizar a atividade do setor de confectionery, estagnada durante os anos 1970 e 80 no Brasil. Com isso, milhões de consumidores ingressaram no mercado e o salto dessa demanda redimensionou as perspectivas de crescimento do setor. Em paralelo, mudanças nos hábitos de consumo desse público ascendente foram realinhadas a um perfil agora predominante no cenário doméstico. Além de uma renovação em todas as frentes de guloseimas, a formação de uma classe consumidora ampliada consolidou o fim da estabilidade verificada em períodos anteriores.
Detentora de fatia em torno de 9% do PIB nacional, a indústria de alimentos em geral (incluso bebidas) não poderia passar incólume por uma das piores recessões da história do país. Ainda assim, fechou 2016 com receita da ordem de R$ 614,3 bilhões, cravando crescimento nominal de 9,3% em relação a 2015, capta a Associação Brasileira das Indústrias da Alimentação (Abia). Segundo a entidade, a produção do setor amargou queda de 0,96%, com melhora em relação a 2015, quando houve recuo de 2,9% na produção. As vendas, por sua vez, foram menos ruins, com retração de 0,63%, ante a queda de 2,73% no período anterior. As exportações do setor aumentaram 3,4% em 2016, para US$ 36,4 bilhões; e a contribuição do setor de alimentos e bebidas no saldo da balança comercial foi superavitária em US$ 31,5 bilhões.
Depois de dois anos consecutivos de quedas na produção, vendas e investimentos, as indústrias de alimentação do país previam uma retomada do crescimento no início de 2017. Essa expectativa levava em conta a previsão de crescimento da safra de grãos em relação ao ano anterior, a inflação mais baixa e a perspectiva de estabilização no nível de desemprego e de melhora geral na economia, com a aprovação das reformas trabalhista e previdenciária.
Com base na confirmação apenas parcial desse prognóstico, a Abia projeta para 2017 um crescimento de 0,6% a 1,2% na produção de alimentos, após queda de 0,96% em 2016. Para as vendas, a estimativa é de crescimento real de 0,7 % a 1,5% no período, diante da queda real de 0,63% no ano anterior. No mercado interno, o giro no varejo teve alta nominal de 9,8%, enquanto as vendas no setor de alimentação fora do lar (food service) registraram aumento nominal de 7,1%. Houve uma migração do consumo de fora do lar para dentro do lar e, à medida que houver recuperação na economia, a expectativa é a de que o food service volte a crescer de forma mais acelerada que o varejo alimentar.
Embora menor em volume e mais encorpado em valor, o consumo brasileiro de chocolate segue ainda consistente e hoje traduz vários significados. Além de símbolo da indulgência, ele é o último item da lista de compras supérfluas a ser cortado em caso de crise por conta do relativo baixo desembolso. Por outro lado, em uma singularidade do mercado brasileiro, é visto também como alternativa ao desemprego, desde que consumidores aderiram à sua produção artesanal para complementar a renda doméstica. A data em que o consumo tradicionalmente aumenta acima do padrão é a Páscoa. Acompanhando a estabilização na produção e demanda dos últimos anos, a comemoração em 2017 também perdeu força. As grandes fabricantes de chocolates no país registraram um desempenho entre a estabilidade e crescimento nominal de 10%. A data mais importante para o setor no ano deixou um sabor amargo em 2016, quando as vendas cederam 27,4%. Para a Abicab, o período foi atípico e, apesar da queda na Páscoa, o setor começou a mostrar recuperação nos meses seguintes. Por exemplo, de janeiro a setembro de 2016, a produção de chocolate cresceu 13,2% em volume, ante igual período de 2015, para 393,4 mil toneladas (t). Em 2016, posiciona a entidade, a Páscoa respondeu pela produção de 14,3 mil t, volume equivalente a 58 milhões de ovos de chocolate. Esse volume, no entanto, foi menor que as 19,7 mil t produzidas em 2015.
No balanço de 2017, a comemoração não acusou mudança significativa nas vendas. Com 120 lançamentos, as indústrias reduziram o número de novidades em resposta ao recuo de vendas visto um ano antes. De acordo com a Abicab, as empresas preferiram ser mais conservadoras depois da decepção com o desempenho em 2016, recorrendo às marcas fortes e faixas de preço mais baixas. Mas o setor continuou a diversificar a oferta, com tamanhos variados e produtos para todos os bolsos.
Pelas planilhas da Abicab, o mercado de chocolates totalizou queda de 0,4% no primeiro semestre de 2017, mas deu sinais de recuperação na segunda metade do ano. A tendência de recuperação, no entanto, é lenta e as indústrias associadas estimam crescimento de 2% a 4% em volume, no balanço de 2017, em comparação com o exercício anterior. Pelos radares da consultoria Euromonitor International, as vendas de chocolates no Brasil devem cravar queda de 5,9% em volume em 2017, para 256,5 mil toneladas. Em valor, o recuo estimado é de 4,9%, para R$ 11,96 bilhões. Nos últimos cinco anos, estima a Euromonitor, as vendas de varejo de chocolates saíram de R$ 11.251,8 milhões em 2012 para R$ 11.964,2 milhões em 2017, projetando recuo para R$ 11.303,5 milhões em 2022.
Atentas às mudanças no setor e a uma demanda diferenciada, as redes de chocolaterias como Cacau Show, Brasil Cacau e Kopenhagen (Grupo CRM) degustam uma expansão que mudou de vez a concorrência. Pelos radares da Abicab, essas redes especializadas saltaram de 200 lojas para mais de 4 mil em uma década. Ganhando cada vez mais espaço e relevância, o segmento de chocolates premium já se aproxima de 7% da produção nacional, estima a entidade.
O Brasil é o terceiro maior mercado consumidor de chocolates no mundo e continua exibindo potencial para avançar. Cada brasileiro consumiu, em média, 2,5 quilo do produto em 2017, quase o dobro de dez anos atrás, porém menos que a metade dos Estados Unidos.
Processando chocolate próximo ao limite de sua capacidade desde a década passada, o setor vinha bombando até 2014. As mudanças nos hábitos de consumo, com conceitos de saudabilidade em pauta na preferência do consumidor, marcaram a construção desse quadro. Em 2015, no entanto, a demanda sinalizou ter alcançado algum grau de saturação. A agitação em torno da produção, venda e consumo de chocolate no Brasil não tem precedentes em toda trajetória dessa categoria de alimento. Para se ter uma ideia da dimensão dessa evolução, há 40 anos o consumo per capita de chocolate no país, então com 90 milhões de habitantes, girava em torno de 300 gramas. A primeira e única campanha em prol do aumento da demanda que se tem notícia, envolvendo os principais fabricantes, foi levada a cabo nos anos 1970 e o índice saltou para cerca de 800 gramas. Desde 2010, o consumo brasileiro oscila entre 2 e 3 quilos/habitante/ano, volume considerado ainda modesto, mas com crescimento acelerado nos últimos anos. De vilão da alimentação sadia, o chocolate virou a coquecluche do ramo funcional, entrando para a lista dos alimentos que comprovadamente trazem benefício à saúde. A tiracolo dessas constatações, proliferam empreendimentos tanto do lado do fornecimento como da venda ao varejo. Em suporte a essa onda, também se multiplicam eventos como workshops, congressos e feiras.
Com essa movimentação, a indústria de chocolate vinha despejando investimentos condizentes com o avanço da demanda interna e externa. Esses recursos, no entanto, começaram a rarear quando o ambiente econômico-financeiro se estagnou e o PIB do país veio abaixo. Entre grandes empreendimentos bancados recentemente no setor sobressai o do Grupo Vonpar. Controlador da Vonpar Refrescos, ex-franqueada da Coca-Cola Femsa no Rio Grande do Sul e Santa Catarina, o grupo empresarial expandiu sua atuação de mais de 60 anos no segmento de bebidas, ingressando no filão alimentício. Para isso, adquiriu três operações gaúchas do setor de confeitos (Mu-Mu, Wallerius e Neugebauer), que integram a atual Divisão Alimentos, braço do grupo para esse setor. Fundada em 1891, a fábrica de chocolates da Neugebauer localizada no bairro Navegantes, em Porto Alegre, foi desativada em 2013. A nova unidade, instalada em terreno de 110 mil metros quadrados, interliga-se à estrutura já existente da divisão de balas e pirulitos, em Arroio do Meio (RS), totalizando um complexo de mais de 30 mil metros quadrados. O projeto da planta de chocolate segue o figurino das mais modernas instalações para processamento de cacau em todo o mundo. Ela reúne maquinário de procedência europeia, basicamente da Suíça, Alemanha e Itália, elevando a capacidade anterior em cerca de 200%. A Vonpar triplicou os volumes de produção e a capacidade total da unidade hoje oscila entre 2-3 mil t mensais de diferentes tipos de produtos (barras, confeitos e bombons).
Apesar do crescimento do setor nos últimos anos, o consumo de chocolates no Brasil ainda é considerado baixo. Um dos fatores desse cenário é a precária logística para cobertura da distribuição, consideradas as dimensões do país. Um estudo da consultoria Mintel sustenta, entre várias conclusões, que o desenvolvimento do Norte/Nordeste do país se insere como um importante foco do mercado. Desde 2010, um pouco mais de um quinto dos consumidores afirmam que estão consumindo mais chocolates do que em anos anteriores. Nesse mesmo período, quase um terço dos consumidores no Sul disseram que aumentaram a compra do produto. A principal diferença entre as regiões está na quantidade de chocolates comprada em cada ocasião. Persiste ainda uma diferença entre o número de consumidores no Nordeste que come barras individuais tamanho padrão (48%) comparado aos do Sul (64%).
Motivada por esse consumo muito aquém do seu potencial, a indústria nacional se posiciona entre os maiores produtores globais de chocolate. Ao ultrapassar a França, em meados da última década e, mais recentemente, o Reino Unido, o Brasil ascendeu ao terceiro lugar, revigorando um cenário marcado no passado pela estabilidade. Por mais de dez anos o país se manteve na quinta colocação, com produção e consumo de chocolate estagnados. Desde 2010, o setor mantém a atual colocação de destaque no ranking global, deixando para trás as indústrias chocolateiras francesas, italianas, suíças e dos países baixos, tidos como ilhas de excelência na produção de chocolate. Na atual posição, o país só perde para os EUA e Alemanha, ficando à frente de potências como o Reino Unido, França e Itália. Com produção anual na faixa de 530 mil t, na média dos últimos quatro anos, o setor fechou 2016 com 489 mil t, volume que assinala queda de 3,5% sobre o ano anterior. Mas no primeiro semestre de 2017 o recuo foi menor, em torno de 0,4% em comparação a idêntico período de 2016. O consumo aparente, no entanto, cravou alta de 8,8% nos primeiros seis meses do ano. (ver quadro à página 11).
Conquistada ao longo das últimas décadas, a estabilidade econômica conferiu até recentemente maior poder de compra às camadas de baixa renda, conduzindo o mercado brasileiro a uma faixa que supera 100 milhões de consumidores. O país se transformou dessa forma em foco dos investimentos internacionais, sendo chocolates, biscoitos, snacks e candies as opções de maior destaque no menu de guloseimas. Pelos dados oficiais a produção brasileira de chocolates sob todas as formas (coberturas em barra, tabletes, bombons, confeitos, achocolatados em pó, ovos e figuras de Páscoa), que rondava a faixa de 200 mil t no início da década de 90, alcançou volume acima de 300 mil t na virada do milênio e, na atual década, se sustenta em faixa superior a 400-500 mil t.
Dentro da categoria de chocolate, um dos filões mais disputados no país é o de bombons do tipo bola (11%) que, somados a outras variedades como as caixas sortidas (35%), abocanha 46% da demanda total da categoria (ver gráfico à página 14). Os tabletes (30%) e linhas de impulso como snacks do tipo bite size (15%) e candy bars (6%) vêm em seguida, com mais da metade da preferência dos consumidores, cabendo os restantes 3% a confeitos de formatos diversos e coberturas. Fora do chamado consumo continuado, que ocorre durante todo o ano, a demanda de chocolate pode aumentar em até 20-30% entre maio e setembro, por conta dos meses mais frios no Brasil. Em março e abril, período de comemoração da Páscoa, ela cresce fortemente em relação às épocas de giro mais baixo.
Na faixa de 2,5 quilos por habitante/ano, o consumo per capita atual de chocolates também é considerado baixo e acusa uma variação bastante acentuada conforme a região do país. Chega a oscilar de 0,5 a 1quilo nas áreas mais quentes, como o Norte e Nordeste, a 2,5-3 quilos no Sul e Sudeste, que concentram os maiores centros consumidores.
O convívio por anos a fio com um quadro de superoferta fez o segmento de confeitos doces (balas, pirulitos, chicles) se adaptar a esse cenário. Com poucas perspectivas de exportar grandes volumes, essas categorias foram buscar novos filões de consumo doméstico e a foto atual flagra uma disseminação sem precedentes no número de apostas em desenvolvimentos de maior valor agregado. Mesmo assim, desde 2014, acentuam-se déficits na produção e consumo. Levantamento da Abicab capta que em 2016, a produção de candies voltou a operar no azul, com alta de 1,3% em relação ao ano anterior. Mas de janeiro a junho de 2017, voltou a recuar, com déficit de 3,1% na produção, comparado a igual período de 2016.
A projeção de um PIB na faixa de 4%, a partir da metade da última década, reacendeu a disposição do setor brasileiro de confectionery de retomar as vendas internas. O giro de candies açucarados no balcão doméstico permanecia mergulhado em fogo brando havia anos. Para sacudir essa estabilidade, a indústria foi buscar as gôndolas externas e conseguiu, através de embarques crescentes, neutralizar a quase ociosidade nas linhas de produção. De 1999 a 2004, as exportações vingaram com saltos anuais na faixa de 20%. Esse ritmo, no entanto, foi interrompido com a valorização crescente do real frente ao dólar. A disputa doméstica nesse período acabou sendo revitalizada pelo desembarque de marcas globais, que ajudaram a promover aprimoramentos sem precedentes no setor. A maioria das companhias transnacionais de confectionery aterrissou no país, sobretudo a partir da segunda metade dos anos 1990. Elas contribuíram para estabelecer novos padrões de qualidade e consumo, introduzindo conceitos de marketing e operação logística inéditos no cenário local. A chegada dessas empresas contribuiu também para o desenvolvimento de mercados inexistentes no país, a exemplo de confeitos especiais (diet/light, nutracêuticos ou funcionais), enquadrados na tendência de saúde e bem-estar (health and wellness), e de marcas com a tarja orgânica e/ou sustentável, ampliando o espaço dedicado a guloseimas doces no trade atacadista e varejista.
Esse olhar da indústria para o consumo doméstico abriu frentes em regiões onde o consumo per capita era ainda mais inexpressivo. Diversas empresas do setor dos mais variados portes, por exemplo, iniciaram na última década uma corrida ao Nordeste brasileiro, incluindo nomes como Mars, Nestlé, Arcor, PepsiCo e Mondelez, entre as organizações de maior envergadura. Elas atraíram os holofotes e puxaram um cordão engrossado por concorrentes mais intermediários.
Mesmo com produção declinante nos últimos cinco anos, o setor de balas saiu da zona de conforto em meados da década passada. O cenário ao longo dos anos 2000 comprova que as indústrias do segmento vinham conseguindo superar gargalos nas vendas domésticas, com investimentos na modernização do parque de máquinas e apostas em linhas de maior valor agregado. Essa mudança se materializou em itens de qualidade reconhecida pelo consumidor e custos e preços em ponto de equilíbrio, conduzindo a uma recomposição das margens do setor. Enquanto os volumes foram paulatinamente diminuindo o ritmo, a receita foi desenhando trajetória inversa. Com os aportes despejados em expansão de capacidade, desenvolvimentos e inovações, de 2010 a 2013 a produção fechou acima de 400 mil t de candies, sinalizando que o setor havia retomado a trilha do crescimento.
A oferta contínua de linhas básicas, consideradas commodities pelo trade da categoria, acuou os fabricantes em um beco cuja única saída era a da renovação. Com um consumo per capita ainda considerado baixo, a indústria havia se acomodado a uma situação de demanda cativa e só começou a mudar o quadro por conta da acirrada disputa e exposição à globalização, partindo em busca de outros mercados com portfólio renovado e competitividade afiada por insumos fartos, além de um câmbio, a princípio, favorável. Nesse início, as balas, confeitos, gomas de mascar e derivados brasileiros emplacaram como novidade por conta de trunfos como disponibilidade de açúcar a preços baixos – ao contrário do que se verifica hoje –, os embarques para o exterior ganharam músculos. De 2001 a 2004, as exportações saltaram de 90 mil t para 153 mil t, pico que a partir de 2005 entrou em declínio, estabilizando na faixa de 120 mil t. Com a imagem de fonte de itens populares, o país conseguia emplacar vendas em balcões de países da África, América do Sul e Central, com preços atraentes. Mas já há alguns anos o setor vem trabalhando no sentido de agregar valor às linhas básicas e conseguiu mudar essa imagem, como indicam os resultados obtidos em participações recentes em feiras de negócios internacionais, a exemplo da ISM – Feira Internacional de Doces e Biscoitos, maior vitrine global do setor de confeitos, montada no início de 2018 em Colônia (Alemanha). Apesar da queda em volumes, os embarques se mantiveram em valores e, em alguns casos, até renderam superávit, com o reajuste das tabelas aos poucos assimilado pelos compradores. Com 19 empresas no espaço coordenado pela Abicab e pela Associação Brasileira da Indústria de Biscoitos, Massas Alimentícias, Pães e Bolos Industrializados (Abimapi) em parceria com a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil), os confeitos brasileiros pontuaram no circuito das inovações.
Balas, confeitos, gomas de mascar e derivados encorpam no Brasil um filão de oferta e demanda diferenciado que, no entanto, não destoa da agitação verificada hoje na área dos chocolates. Depois de superar um ciclo de qualidade baixa e preços predatórios que varou as décadas de 1970 e 1980, a indústria brasileira foi sacudida pela abertura comercial e globalização nos anos 1990. Da exposição a artigos importados e intercâmbio comercial com o exterior, emergiu um setor mais atento à qualidade, antenado nas tendências internacionais e disposto a investir em marketing e promoção para sobressair com inovações e produtos de maior valor. Foi por essa trilha que a indústria nacional de balas e confeitos cavou boas oportunidades no flanco das exportações.
A produção na faixa de 417 mil t nos últimos seis anos mantém o Brasil na terceira colocação mundial do segmento de balas e confeitos de açúcar, atrás dos Estados Unidos e Alemanha, permanecendo à frente de pesos-pesados do setor, como o Reino Unido, Japão, Espanha e França, repassa a Abicab. Pelos monitores da entidade, o balanço de chocolates e candies se manteve sem sobressaltos nos últimos dez anos, registrando declínio nos últimos 2-3 anos.
Integrante do International Office of Cocoa, Chocolate and Sugar Confectionery (IOCCC) e do conselho da ICA (International Confectionery Association), a Abicab congrega os sindicatos que atuam regionalmente, representando 92% do mercado de chocolates, 70% do universo dos fabricantes de balas e confeitos. Desde 2001, ela incorpora a categoria amendoim, reunindo produtores e indústrias sob o guarda-chuva do projeto Pró-Amendoim, que instituiu o Selo Abicab de Qualidade, criado com o propósito de defender e promover a categoria de doces e confeitos à base da oleaginosa e cujos associados têm representatividade acima de 80% do segmento.
Dois investimentos que vingaram na década atual reforçaram o lado da produção de confeitos à base do amendoim. A aproximação dos 70 anos de atividade demarcou o projeto da Santa Helena de instalação de uma planta para sua expansão na ala de snacks da oleaginosa, que absorveu R$ 30 milhões. Colocada em marcha em Ribeirão Preto (SP), a unidade tem capacidade para produzir 4 mil t mensais de confeitos de amendoim. Em Marília, também no interior de São Paulo, a Dori cortou na mesma época a fita inaugural de sua Unidade 40. Trata-se de uma fábrica para a produção exclusiva de confeitos à base de amendoim, localizada no complexo da empresa naquela cidade. Capacitada a produzir inicialmente 3 mil toneladas mensais de itens doces e salgados, a fábrica partiu com um quadro efetivo de 200 funcionários, sendo 150 alocados na produção.
Produzindo em torno de 350 mil t no início dos anos 1990, o reduto de balas e confeitos de açúcar acusou salto superior a 30% no final daquela década, patamar esse mantido até 2010, quando se fixou na faixa das 400 mil t. Projeções da entidade indicavam que, em decorrência da manutenção dos investimentos em capacidade, desenvolvimentos e inovações, 2016 deveria retomar o avanço, com o setor dando continuidade à trajetória de crescimento sustentado, apesar da queda de 3,6% em 2015 (ver quadro à página 15). A previsão vingou e a indústria cravou alta de 1,3% em 2016 em relação ao exercício anterior. Estudo da consultoria Euromonitor International no varejo da categoria indica que, nos últimos cinco anos, as vendas de confeitos açucarados saíram de R$ 3.868,1 milhões em 2012 para R$ 4.637,0 milhões em 2017, projetando avanço para R$ 4.881,2 milhões em 2022. Consolidadas separadamente, as vendas de gomas de mascar saíram de R$ 7.636,9 milhões em 2012 para R$ 8.264,5 milhões em 2017, projetando avanço para R$ 8.375,4 milhões em 2022.
Depois de ultrapassar a barreira das 400.000 t, a produção manteve esse patamar até 2013. No triênio de 2014 a 2016, produziu aquém desse volume. A trajetória de alta coincide com o avanço no consumo bancado pela estabilização da economia. Da mesma forma, o consumo aparente que partiu de 305 mil t em 1992, bateu em 400 mil t cravadas na virada para 2000, com picos acima dessa faixa em 1995, 1996 e 1998, declinando nos anos seguintes. Já as exportações largaram no começo da década de 1990 com 46 mil t, alcançando a marca de 85 mil t em 1993. Depois de cair nos anos seguintes, despencando para 27 mil t em 1998, os embarques reagiram, mantendo-se acima das 100 mil t desde 2003. Em recuperação em função do câmbio desfavorável, fecharam 2016 com 79 mil t, assinalando alta de 17,4% em comparação com os embarques do período anterior. A persistir essa tendência, a Abicab estima que no balanço de 2017 as exportações mantenham o ritmo, pois de janeiro a junho as exportações cresceram 8,1% em relação a idêntico período de 2016. As importações, por sua vez, que não ultrapassavam 700 t em 1992, saltaram para 20 mil t em 1995, exibindo o pico de 37 mil t no ano seguinte. Elas, entretanto, foram declinando a partir de 1999, com o inibidor ajuste cambial, sendo mantidas em 5 mil t, nos balanços até 2007, avançando a partir daí para a faixa acima de 6-7 mil t. Em 2016, os volumes cravaram 7 mil t, registrando queda de 23% em relação ao ano anterior. No primeiro semestre de 2017, elas registraram alta de 16,8% contra o mesmo período do exercício anterior.
Distante do seu potencial, o consumo per capita de balas e confeitos de açúcar no Brasil evoluiu de 1,5 quilo por habitante/ano, no início da década passada, para 2-2,5 quilos, na média dos últimos anos, cravando 2,01 quilos na atualidade. A exemplo da demanda de chocolate, ele também varia bastante conforme a região do país. Pelas sondagens oficiais no varejo, parte de 0,50-0,95 quilo no Nordeste, alcança 2-3 quilos em alguns pontos do Sudeste e cai para menos de dois quilos em outras regiões. Esses índices, no entanto, são considerados baixos e demonstram que as vendas de candies ainda contam com muito espaço para avançar.
A estratégia para buscar saldos positivos na balança comercial elaborada pelo governo brasileiro no final da década de 1990 havia se desdobrado também em apoio oficial à ofensiva da ala de confectionery no cenário exterior, através de parceria da Abicab com a Apex-Brasil. Com o auxílio do órgão, os embarques ao exterior saltaram 87% em dólares nos primeiros cinco anos da última década, contabiliza a entidade. Havia dez anos, o Brasil exportava para cerca de 80 países e, em 2006, a lista saltou para o pico de 167 destinos.
Pelos registros oficiais, os embarques do setor devem manter no atual exercício a tendência dos últimos anos, totalizando em 2016 algo em torno de 107 mil t, volume, no entanto, 14% maior ao registrado no exercício anterior. Do total das exportações brasileiras, cerca de 70% referem-se a balas e confeitos (inclusos os à base de amendoim) e os restantes 30% às remessas de chocolate, estima a Abicab. De 2000 e 2010, os embarques de chocolates, confeitos e amendoim doce e salgado saltaram de US$ 152 milhões para US$ 304 milhões. As vendas ao exterior dobraram em dólares e aumentaram 30% em volume, passando de 105 mil toneladas para 133 mil toneladas no período. A expansão foi acompanhada de fortes investimentos. Apenas entre 2009 e 2012, a indústria investiu US$ 400 milhões em projetos de modernização, com abertura de plantas e linhas de produção, melhorias de processo e programas de sustentabilidade.
Fonte de preocupação para os exportadores nacionais na atualidade, o câmbio esteve favorável aos embarques a partir da virada do milênio e foi pivô dessas expansões de capacidade e novas plantas industriais concretizadas durante a década. Entre os projetos de longa maturação e que fogem desse quadro conjuntural, sobressai o complexo industrial da Mondelez, em Curitiba (PR), erguido com parte de um aporte de US$ 700 milhões despejados pela corporação em sua operação local e apresentado como a maior e mais atualizada planta integrada de guloseimas como chocolates, biscoitos, queijos, refrescos e sobremesas em pó do grupo no planeta. Ao lado dos complexos da Nestlé e Garoto, em São Paulo e Espírito Santo, respectivamente, no Sudeste brasileiro, ela simboliza o perfil da nova indústria brasileira de chocolates e candies.
O desembarque das linhas de candies do Brasil no mercado internacional, no entanto, aconteceu ainda na década de 1980, quando a Abicab promoveu a estréia de algumas indústrias na feira ISM. Foi a crescente adesão do setor à delegação brasileira em eventos no exterior que mobilizou a entidade na busca de apoio governamental. Assim, ela idealizou a união de empresas brasileiras em feiras no exterior no espaço de ilhas, identificadas pelo símbolo nacional com a logomarca Sweet Brasil. Esse esforço para construir a imagem de exportador coincidiu com a criação pelo governo brasileiro da agência de promoção de exportações que, em síntese, banca 50% do orçamento nos projetos de participação em feiras internacionais da indústria para elevar as vendas externas. Na ativa desde 1998, o projeto Sweet Brasil é o conjunto de ações do plano setorial integrado celebrado entre a Abicab e a Apex-Brasil para a ampliação das exportações do setor. Consiste em ações de promoção (feiras, eventos e rodadas de negócio) e inteligência comerciais (estudos de mercado, relatórios comerciais e de oportunidades), entre outras atividades estratégicas conduzidas junto aos exportadores para o incremento quantitativo e qualitativo de suas vendas internacionais.
Escoradas em escala de produção, alta qualidade e unidas em torno do projeto Sweet Brasil, as empresas associadas à Abicab construíram ao longo da última década um corredor de exportação, que vem sendo mantido mesmo com o câmbio desfavorável e sacrifício de margens de contribuição. Operações de menor porte foram incluídas nesse processo através da contribuição de entidades como o Cereal-Chocotec (Centro de Tecnologia de Chocolates, Balas, Confeitos e Panificação), do Instituto de Tecnologia de Alimentos (Ital), de Campinas (SP). Em parceria com a Abicab e apoio da Apex-Brasil, a instituição foi acionada na execução de um programa de desenvolvimento de produtos voltados ao mercado externo para indústrias que nunca haviam exportado. Essa atividade contínua criou nos últimos anos uma consistente mentalidade empresarial do setor voltada ao comércio exterior, solidificando a imagem do Brasil como player internacional.
O atual estágio da indústria brasileira de confectionery é fruto da revitalização implementada a partir da abertura do mercado interno, ainda no início da década de 90, marcando pontos dentro de fora do país. Essa transformação ganhou consistência com a estabilidade na economia e controle dos índices de inflação. A concorrência no âmbito doméstico conta na atualidade com a participação das maiores corporações globais do setor de chocolates e candies. Além dessa cobertura, o abastecimento é reforçado por um escalão crescente de empresas nacionais de pequeno e médio porte. Com foco maior em confeitos de açúcar do que em chocolates, esse cinturão de indústrias intermediárias aloja fabricantes com capacidades ao redor e acima de 30 mil t anuais, aptos a desenvolver produtos atualizados para, sobretudo, disputar o mercado externo.
Escorada na faixa acima de 1 milhão de t nos últimos dez anos, a indústria nacional de biscoitos sobressai na vice-liderança mundial da categoria, atrás apenas dos EUA, que despejam em torno de 1,5 milhão de t/a, dimensiona a Abimapi. A instituição congrega o terceiro maior mercado global produtor e consumidor de biscoitos e massas alimentícias e o sétimo em pães e bolos industrializados, além de representar 75% do setor que gera mais de 100 mil empregos diretos. Só no Brasil, responde por um terço do consumo nacional de farinha de trigo. Ela também aglutina os principais fabricantes nacionais de biscoitos, sendo que os 20 de maior porte respondem por 70% do faturamento geral da categoria, que fechou 2016 com R$ 21,853 bilhões (fábrica) em caixa, resultado 3,9% superior ao do exercício anterior. Pelas planilhas da entidade, refletindo a performance de todo o setor, a categoria acusou redução de 2,7% no volume de vendas – com a colocação de, aproximadamente, 1,7 milhão de toneladas – e retração também do consumo per capita, que caiu de 8,5 para 8,2 quilos/habitante/ano. Os dados refletem o comportamento do consumidor que, diante da crise econômica enfrentada no país, diminuiu sua frequência de compras, mas não retirou da cesta os produtos básicos para o dia a dia, como rosquinhas e biscoitos do tipo Maria/Maisena. Essas duas modalidades de biscoitos, inclusive, foram os principais impulsionadores do crescimento da categoria em 2016/2017 e registraram aumento de 7,5% e 1,5% em volume de vendas, e 14,5% e 11% em faturamento, respectivamente. Até recentemente campeões da preferência na categoria, os biscoitos recheados perderam força em comparação ao mesmo período anterior, cravando 25% de participação de mercado no segmento em 2016, reporta a Abimapi.
Mudanças recentes nos hábitos de consumo promoveram uma reviravolta nas vendas de alimentos, com reflexos diretos em categorias de guloseimas como biscoitos. As transformações nas atitudes dos consumidores também impactaram os canais de distribuição, com a valorização do formato de atacarejo e o aumento na oferta de produtos saudáveis. Por outro lado, o freio na compra por impulso, a multiplicação de marcas próprias e a retração em setores consolidados, como o de food service, inserido no corte do orçamento para entretenimento, patrocinaram o resgate das marmitas e a reabilitação da comida de rua pelo contingente formado por quem não encontra colocação formal.
Também distante do seu potencial, o consumo per capita de biscoitos no Brasil pulou, ao longo da última década, de 3,8 quilos/habitante/ano para os atuais 8,2 quilos. No varejo da categoria, o período histórico dos últimos anos demonstra que o mercado de biscoitos acusou crescimento satisfatório, tanto em valores como em volume, mas vem emitindo sinais de retração no consumo e queda no preço médio unitário, face ao avanço de pequenas marcas e forte concorrência em preços. Confirmando o diagnóstico, o volume consumido em 2017 deve ficar ao redor de 1,3 milhão de toneladas, movimentando vendas no varejo acima de R$ 23,7 bilhões, conforme dados da Euromonitor International. Pelas projeções da consultoria, o varejo de biscoitos deve continuar movimentando volumes na faixa acima de 1 milhão de toneladas nos próximos anos, atingindo 1,3 milhão de t e receita de R$ 25,9 bilhões no fechamento de 2021.
Com penetração acima de 90% nos lares brasileiros, o setor de biscoitos movimenta há cerca de uma década e meia um plano para sacudir a estabilidade doméstica, reforçando flancos como o da promoção externa, apesar da flutuação cambial nem sempre favorável aos embarques. Segundo a Abimapi, as exportações em 2016 foram da ordem de 39,4 mil t, volume 0,5% superior ao do exercício anterior, que representaram receita de US$ 74,0 milhões (FOB). Com resultados como esses, a ala de biscoitos ocupa a 36ª colocação entre os setores exportadores brasileiros. Os cinco maiores destinos são EUA, Paraguai, Uruguai, Angola e Cuba, sendo o biscoito do tipo recheado o principal item da pauta, representando cerca de 40% do total exportado.
Ao longo dos últimos anos, a Abimapi promove a participação do setor em feiras internacionais em todos os continentes, através do Projeto Setorial Integrado (PSI), bancado em parceria com a Apex-Brasil. No início de 2013, a entidade lançou a marca Happy Goods para representar o setor no exterior e melhorar a percepção dos compradores em relação aos produtos brasileiros. A intenção é também chamar mais a atenção do mercado comprador internacional para o importante parque tecnológico, para a qualidade dos produtos e para a força das empresas nacionais. Essas características são valorizadas pelo selo Baked in Brasil, um slogan que acompanha as marcas reforçando a origem dos produtos nacionais.
Reformulada em 2016, a marca Brazilian Biscuits, Pasta and Industrialized Breads & Cakes resulta da posição da indústria com vistas à promoção de seus produtos no mercado internacional. A iniciativa também passou a denominar a parceria entre a Abimapi e a Apex-Brasil em favor das exportações. Das diversas atividades desenvolvidas nos últimos anos, sobressai a participação em feiras internacionais como Americas Food and Beverage Show Miami, Confitexpo Guadalajara, Summer Fancy Food New York, Sial Mercosul, Sial Paris, Fihav, Gulf Food, Foodex Japan, Anuga, ISM e FMI Dallas. Com mais de 16 anos de existência, a parceria Abimapi/Apex-Brasil promove cerca de 40 empresas que representam em torno de 70% das exportações nacionais destinadas a mais de 80 países nos cinco continentes. •
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