Com a inflação subindo, a renda comprometida e o crédito restrito, o consumidor optou por beber menos cerveja e refrigerante. Para compensar a freada, ele bebe mais suco pronto, chá e água mineral. Responsável por essa sacada, a Nielsen flagra, por exemplo, que as vendas da categoria de sucos prontos para beber (SPB) no varejo nacional crescem anualmente em torno de 10% em volume (10,5% em 2013). “Esse consumo avança a cada ano, independentemente da pressão inflacionária, pois vem se consolidando como um novo hábito”, observa Fabio Gomes, analista da consultoria. Pela varredura da Euromonitor International, que também audita as duas categorias, o mercado de refrescos em pó movimentou R$ 4,730 bilhões em 2014, enquanto que o de SPB totalizou R$ 11,460 bilhões no mesmo período. Mais práticas e com apelo saudável, além de maior valor agregado, as bebidas como refrescos e sucos prontos se encaixam entre as tendências mais em voga identificadas pelos radares do varejo no consumo do brasileiro. A visão se identifica com a opinião de quem opera a etapa anterior da cadeia de produção de refrescos e sucos prontos. “O brasileiro sempre foi um grande consumidor, por exemplo, de refrescos em pó”, nota Suzana Klein, analista de comunicação institucional da Duas Rodas, supridora de ingredientes e matérias-primas para o setor de alimentos, bebidas inclusas.
Nos últimos anos, acrescenta ela, com o aumento da renda e o acesso a produtos de maior valor agregado, os sucos prontos tiveram um impulso muito grande, sendo em alguns casos, alternativas ao refrigerante e ao próprio refresco. Esse movimento criou oportunidades de renovação para a indústria de bebidas em pó, que passou a apostar em sabores diferenciados, versões diet/light, com adição de fibras e/ou extratos, além de novos formatos para atender mais conveniências do consumidor. “Tais inovações mantêm o potencial do mercado de refrescos em pó ao mesmo tempo em que o setor de sucos prontos tende a continuar expandindo, pois vive um momento de diversificação de portfólio e ascensão de novas marcas”, sublinha ela. Além disso, grifa, a regulamentação que aumenta o teor de fruta para os néctares de laranja e uva tende a atrair ainda mais consumidores para esse mercado. As novas regras do Ministério da Agricultura incluem a obrigatoriedade de informar no rótulo os percentuais de ingredientes de bebidas não alcoólicas. Desde janeiro, os fabricantes devem aumentar a quantidade mínima de suco de fruta nos néctares de uva e laranja. Pela nova regra, o percentual passa de 30% para 40%, chegando a 50% a partir de 31 de janeiro do próximo ano.
A percepção na Duas Rodas é compartilhada pela distribuidora Vogler, que também opera com ingredientes como corantes, edulcorantes, aromas e aditivos nos segmentos de bebidas em pó e SPB. Para o coordenador de marketing Régis Inácio, tanto a indústria de refrescos em pó como a de sucos prontos têm um grande desafio para garantir a continuidade dessa demanda em alta. “Os consumidores procuram facilidades, mas atualmente querem um algo a mais, querem benefícios”, sintetiza ele. O reduto de bebidas em pó, observa, passou nos últimos anos por uma grande mudança na composição dos produtos, que foi puxada pela substituição parcial do açúcar. “Além da rotatividade de sabores, são poucas as inovações no segmento”, nota Inácio. Já a linha de SPB tem evoluído por conta de avanços na legislação, como as novas regras do Ministério da Agricultura. Ainda assim a maioria dos consumidores ainda não sabe distinguir o que é suco, polpa, néctar e refresco, sustenta o executivo.
Na Daxia, fonte de aromas naturais, hidrocolóides e pectina cítrica, entre outros insumos recrutados em refrescos e sucos, a diretora Helô Varconte Blanco pondera que, apesar dos volumes de consumo dessas bebidas ainda serem muito menores do que o de carbonatados, como refrigerantes, é um filão de potencial incipiente que sinaliza uma enorme expansão. “Ambas as categorias formam um segmento bastante representativo nas operações da Daxia, pois excetuando o suco natural, todas as demais variações utilizam aditivos que fazem parte de nosso portfólio”, frisa a diretora. Para ela, essa demanda hoje em dia é acentuada pela incorporação de ingredientes como hidrocolóides (gomas), corantes naturais e adoçantes nas formulações da clientela de refrescos e sucos. Entre as tendências atuais, não apenas na indústria de bebidas, mas em todo o setor alimentício, ela nota a crescente busca por produtos com um apelo mais saudável e natural.
“Alinhados com essa corrente, desenvolvemos uma linha de corantes naturais, com destaque para os tons avermelhados (com o Carmim de Cochonilha), esverdeados (com Clorofila), alaranjados (com Urucum e Cúrcuma) e o Betacaroteno, nosso mais recente desenvolvimento”, assinala Helô. Além dos aromas naturais e idênticos aos naturais, a Daxia disponibiliza a pectina cítrica natural, encontrada em grande parte das frutas cítricas, com expressiva participação nas vendas da distribuidora para o segmento de bebidas. “Quanto à oferta de edulcorantes desenvolvemos o Docemix, que é uma combinação de adoçantes com insignificante sabor residual e de altíssimo poder de dulçor”, frisa a executiva.
Escala piloto
Suzana Klein, da Duas Rodas, complementa que a empresa atua fortemente no segmento de bebidas não alcoólicas no Brasil e demais países da América Latina, desenvolvendo soluções com garantia de sensorialidade e segurança alimentar. “Nosso centro tecnológico (CT), equipado com laboratórios e plantas-piloto, com destaque para a de pasteurização (UHT), assegura total apoio aos clientes em escala piloto de parâmetros dos processos industriais, com agilidade, conexão com as tendências e portfólio diversificado, atendendo características sensoriais necessárias como impacto, fidelidade e naturalidade de sabor”, ela detalha. Entre as recentes inclusões no portfólio, a executiva insere os aromas com características fiéis às frutas e padrões a que se remetem, tanto para melhorar o aspecto da indulgência nos produtos finais como para ampliar as sensações de naturalidade e frescor que, ela sublinha, são exigências do mercado atual. “Em sintonia com essa tendência, lançamos em abril a Coleção Cítricos, que oferece 12 perfis de sabores com alta performance em aplicações diferenciadas”, informa.
A partir de um estudo apurado dos principais perfis de frutas cítricas consumidas no Brasil e na América Latina, sabores que eram até então trabalhados de forma padrão foram repaginados, relata Suzana. As características resultantes atendem aos movimentos de diversificação, fidelidade de sabor e também de promoção de experiências. “Quando um refresco em pó, por exemplo, tem o sabor limão cravo, traz consigo notas de nostalgia, de fruta colhida direto do pomar da casa da avó, agregando, assim, valor à marca através da experiência do consumidor”, exemplifica.
Em paralelo aos aromas cada vez mais elaborados, acrescenta a diretora da Duas Rodas, a unicidade de um produto se completa com a textura, motivando a importância de bons agentes de textura, de coloração adequada e atrativa, e promotores de saudabilidade (redutores de açúcar, vitaminas, minerais, proteínas). “A harmonia de tudo isso é sinal de presença certa nas casas dos consumidores, mesmo que muitas vezes o custo de aquisição seja um pouco maior que o dos demais produtos”, observa ela.
Entre as tendências em voga na cena de bebidas não alcoólicas, a dos funcionais vem ao encontro da busca do consumidor pelo melhor para a saúde e bem-estar, incluindo benefícios como promoção de energia, realçadores de beleza, suprimento de vitaminas, aumento de imunidade e auxílio metabólico. Ainda assim, nota ela, são pontos que, apesar de tendência, ainda não correspondem ao “plus” que um produto pode ter. “Nesse sentido trabalhamos ativamente com extratos naturais de plantas e frutas para corresponder à expectativa gerada pela tendência com propriedades antioxidantes, termogênicas e energizantes (cafeína)”, grifa. Para ela, o estilo da busca pelo melhor inclui em sua base também as reduções de açúcares, gorduras e calorias e naturalidade.
Ainda no capítulo das tendências, Suzana encaixa a demanda crescente dos chamados sucos detox. Ela conta que a Duas Rodas tem recebido muitas demandas relacionadas a esse conceito, que é uma corrente em potencial no mercado de sucos. “Até o momento, a forma como temos atuado está na composição de sabores que valorizem e impulsionem a tendência. Em alguns projetos, além dos aromas, há incremento com produtos da linha de extratos, como o mate, o guaraná e o café verde, que contam com propriedades antioxidantes”, repassa.
Na Vogler, que está completando 25 anos de atividade, o coordenador Régis Inácio reporta que o segmento de bebidas é um dos mercados-chave da distribuidora e, por conta dessa condição, a gama de ingredientes específicos é extensa. Além de corantes naturais, substitutos de açúcar natural, como a stevia, e blends exclusivos para aplicações no segmento, a empresa disponibiliza fibras, colágenos, enzimas, aromas, carotenóides e vitaminas. “A lista inclui ainda o Ferrazone, fonte de ferro; extratos naturais, extratos aromáticos CO2, acidulantes, conservantes, espessantes e uma linha completa de hidrocolóides”, acrescenta.
Fora a produção e fornecimento de blends de ingredientes, através da sua divisão Vogler Systems, a distribuidora opera parcerias com indústrias e marcas internacionais que têm impulsionado a demanda pelo seu portfólio de matérias-primas nos últimos anos. Desde 2013, ela distribui emulsificantes para panificação da Basf e a linha de corantes naturais da Chr Hansen e, no ano passado, assumiu as representações da Evonik e Wacker no Brasil, relata Inácio. “Por conta da expansão nas frentes de negócios estamos ampliando a estrutura física que, a partir do segundo semestre, vai multiplicar por oito a capacidade atual”, sublinha o coordenador da Vogler, completando que, de cerca de 1.200 posições de pallets, a infra de estoque vai saltar para mais de 10 mil posições. •