Sede com moderação
Ainda sentindo o recuo na demanda de bebidas não alcoólicas, depois de pelo menos uma década de avanço contínuo, o setor ingressou em 2016 com perspectiva de estabilização, com as marcas direcionando apostas para nichos mais promissores, a exemplo de sucos integrais e opções funcionais. A retração maior se deu no segmento de néctares (sucos com mínimo de 30% de polpa da fruta), pois versões do tipo 100% fruta ou com vitaminas e fibras mostram consumo firme e ascendente, confirmam dados da Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes e de Bebidas não Alcoólicas (Abir). No lado oposto, linhas de sucos com concentração de polpa da fruta inferior a 20% igualmente mostraram crescimento no país, por conta do preço mais baixo, como é o caso de refrescos prontos para beber (RTD) e bebidas mistas.
Em relação a volumes, monitoramento da Abir indica que, de 2010 a 2015, a produção nacional de néctares e sucos prontos para beber (SPB) saiu de 743,7 milhões de litros há sete anos para 1,258 bilhão de litros em 2015. Já o total de refrescos em pó avançou de 4,355 bilhões de litros para 4,813 bilhões, no mesmo período. Em 2016, enquanto a queda em volume na categoria de SPB estagnou em 0%, depois de cravar -3,7% no exercício anterior, o declínio no segmento de refrescos em pó avançou para -6,7%, tendo assinalado -3,6% no período anterior.
Com a tendência dos produtos naturais ou integrais, sem adição de açúcar e com maiores propriedades nutricionais em vigor, uma parcela dos consumidores migrou da categoria de refrescos em pó para sucos e néctares. Por outro lado, com o poder de compra enfraquecido pelo desemprego e inflação crescentes, outra parcela da população fez o caminho inverso, retomando o consumo de refrescos em pó e bebidas mistas, com preços mais em conta.
Dados da Euromonitor International, colhidos na ponta do varejo, dimensionam o avanço de sucos e refrescos no país nos últimos cinco anos. Segundo a consultoria, o segmento de refrescos em pó saltou de R$ 3,199 bilhões em 2011 para R$ 5,200 bilhões em 2016, projetando avanço para R$ 6,056 bilhões em 2021. O filão de SPB, por sua vez, pulou de R$ 7,540 bilhões para R$ 16,235 bilhões, no mesmo período, devendo alcançar R$ 21,000 bilhões daqui a cinco anos. Em volume, refrescos em pó saíram de 119,7 mil tonetaladas (t), em 2011, para 135,7 mil t, em 2016, projetando 155,2 mil t em 2021. Na ala de SPB, o salto no período foi de 1,5 milhão de litros para 2,2 milhões de litros, capta a Euromonitor, estimando avanço para 2,6 milhões de litros em 2021(ver quadro à pág. 11).
Enquanto bebidas como refrescos em pó enfrentam cenários desafiantes com a situação econômica instável do país, a diminuição no rendimento dos brasileiros pareceu ter o efeito contrário sobre a categoria e, em particular, em relação ao formato de pó, observa Angélica Salado, analista da Euromonitor International. Embora a categoria seja tradicionalmente percebida como de produtos de baixo valor, os fabricantes têm investido em novos sabores, designs de embalagem e versões enquadradas em saúde e bem-estar, todos comunicados por meio de campanhas publicitárias agressivas, nota a consultora. “Olhando para frente, a categoria de refrescos em pó deve continuar atraindo o interesse do consumidor, como consequência da limitação na renda disponível, pois as vendas no varejo indicam o registro de um crescimento anual de 2% nos preços constantes de 2016, alcançando R$ 8,9 bilhões em 2021”, projeta ela. Contudo, conclui Angélica, se a economia brasileira começar a se recuperar, de 2018 para a frente, os brasileiros também devem se voltar gradualmente para outros tipos de bebidas que tinham incorporado anteriormente ao seu consumo frequente. “Por essa razão, os fabricantes de todos os tipos de refrescos em pó devem continuar investindo em inovação, valor específico, aspectos de saúde e esforços de comunicação para estabelecer uma relação consistente com os seus clientes, e serem menos suscetíveis à perda deles a longo prazo”, orienta a analista.
No front das oportunidades para refrescos em pó, ela sinaliza que uma demanda mais consistente pode emergir da conveniência e tendências de consumo on-the-go. “As características de produto e a embalagem conveniente para permitir aos consumidores transportar os pacotes com eles e preparar as suas bebidas preferenciais em qualquer lugar devem contribuir para trazer um novo movimento dentro da categoria”, assinala Angélica.
Expectativa do verão
Detentora das marcas de refrescos em pó FIT e MID, a Ajinomoto se posiciona entre as fornecedoras da linha de frente da categoria. Adriana Maistro, gerente das duas marcas, considera que o segmento é muito dinâmico e se renova a cada ano para atender cada vez melhor a demanda dos consumidores, “principalmente com melhorias de portfólio, incluindo qualidade, variedade, perfil de sabores, formatos de embalagem e lançamentos inovadores que entregam mais benefícios conectados aos desejos dos consumidores e atuais tendências da alimentação”, elenca. Com base em dados da consultoria Nielsen (T.Brasil – CAGR janeiro a dezembro), ela reporta que, entre 2011 e 2015, o mercado apresentou taxa composta anual de crescimento de 3%. “Em 2017, a categoria apresentou queda em comparação ao primeiro semestre de 2016 devido à redução do consumo dos segmentos não adoçado e semiadoçado”, comenta a executiva. Apesar disso, prossegue ela, o segmento adoçado – em que MID e FIT atuam – teve um crescimento de 2% em volume comparado ao ano anterior, um resultado positivo que reduziu o impacto da queda do total de bebidas não alcoólicas. “Mas a perspectiva para os próximos meses é de crescimento com a entrada do verão”, acalenta Adriana.
Por ser um segmento muito competitivo, ações de ponto de venda (PDV) e pequenas promoções para os consumidores acontecem durante o ano todo. Porém, grande parte do investimento das campanhas de refresco em pó acontece nos meses de verão, acompanhando o crescimento no volume de vendas da categoria. Com o aumento das temperaturas nesse período, a demanda avança, em média, 20% em comparação a outros períodos do ano, observa ela. As marcas MID (adoçado regular) e FIT (diet/light) ocupam a segunda colocação no ranking da categoria, considerando os respectivos segmentos de atuação, com 10% e 19% de participação, respectivamente, posiciona Adriana. “Refrescos em pó são uma categoria madura, presente em mais de 90% dos lares brasileiros, que é percebida como uma opção de bebida prática e refrescante, ao incorporar sabores de frutas, ser adoçada na medida certa e agradar toda a família”, descreve a executiva.
Ela pondera que a tendência de saúde e bem-estar é uma oportunidade para os fabricantes investirem em inovação. Apesar disso, o segmento diet/light, ela exemplifica, apresenta características próprias e diferentes da bebida regular. Com apenas dois players principais – sendo FIT um deles –, ainda possui uma penetração significativamente menor e, no último ano, não apresentou crescimento em volume.
Para Adriana, o sabor continua sendo o principal critério de escolha para o consumidor. Dentro desse contexto, sabores exclusivos devem ganhar importância no volume de vendas. Além do sabor, a identificação emocional com a marca pode ser uma forma importante de diferenciação. “Marcas que trabalham com uma causa, um propósito, tendem a ter mais relevância para o consumidor”, considera ela.
Um exemplo nessa trilha é a linha Ampara do refresco MID, fruto de parceria com a ONG de mesmo nome, que reverte um percentual das vendas para iniciativas em prol dos animais. “Essa linha apresentou um crescimento acima de 50% neste ano em comparação a 2016, com muitas oportunidades, já que têm sido as versões mais elogiadas e solicitadas pelos consumidores em nosso SAC (Serviço de Atendimento ao Consumidor)”, assinala a gerente.
Entre os lançamentos, ela destaca o FIT Tea, opção zero açúcar disponível nos sabores Chá com Pêssego e Chá com Limão. “É o único que pode ser preparado como o consumidor preferir: com água quente ou gelada, reforçando o posicionamento ‘A melhor escolha é a sua’, empregado pela marca”, exemplifica. Pelo segundo ano consecutivo, acrescenta ela, o refresco da Ajinomoto banca a ação promocional MID Machine, com a utilização de uma máquina de refrescos que circula por diversas regiões do país. “O objetivo é reforçar o posicionamento ‘O Bom É Dividir’, através da ativação que consiste na máquina servir o refresco somente quando há colaboração simultânea de cinco pessoas”, frisa Adriana. Essa ação segue até março de 2018 e pode ser conferida em São Paulo, Recife (durante o carnaval) e em supermercados da região Sul.
Campanha o ano inteiro
Bruno Costa Zenha, gerente de marketing e trade do grupo GSA, insere que o consumidor brasileiro busca nesse momento equilibrar o orçamento domiciliar. Por meio de pesquisas nos supermercados, ele observa as marcas que repassam melhor impressão de qualidade e custo/benefício em relação às marcar líderes. “Além disso, esse consumidor entende que, para oferecer uma bebida não alcoólica à família, a melhor opção entre refrigerantes, sucos e néctares, comparando preço por litro, calorias, teor de açúcares e praticidade, hoje em dia é o refresco em pó”, sustenta o executivo.
Operando prioritariamente em regiões do país em que as temperaturas elevadas são freqüentes, a GSA está presente em 60 mil PDVs e promove campanhas durante os 12 meses do ano, uma vez que o refresco é consumido o ano inteiro e não apenas no verão. O desafio é oferecer um produto de qualidade e com sabores variados, além de um custo assimilado como favorável ao consumidor. Adotando essa estratégia, o grupo GSA vem assinalando crescimento de 17% em 2017 em relação ao exercício anterior e a expectativa para 2018 é manter o avanço na casa dos dois dígitos, repassa Costa. “Neste ano, investimos na modernização da marca Refreskant e suas embalagens, além de adicionar mais vitaminas e zinco em nosso produto, e também reformularmos as apresentações das marcas Icebel e Velly”, informa o gerente, acenando com ações voltadas à Copa do Mundo da Rússia no próximo ano.
Andando de lado
Quanto aos sucos prontos para beber (SPB) no Brasil, Angélica, da Euromonitor, observa que a categoria também foi diretamente afetada pela situação econômica instável e diminuição na renda dos consumidores. Depois de registrar uma sequência de taxas de crescimento de dois dígitos em volume no varejo, a categoria andou de lado em 2015, crescendo somente 2% em 2016. “Os dois segmentos mais importantes dentro de SPB em termos de volume no varejo – néctares e sucos (com até 24% de suco da fruta) – enfrentaram desaceleração, registrando -4% e 5% de taxas de crescimento, respectivamente, em 2016”, relata a expert. Embora esses segmentos tendam a exibir preços mais baixos em comparação a sucos 100% integrais, ela exemplifica, avançam em penetração especialmente entre consumidores de média renda, severamente afetados pelo cenário econômico. Uma tendência importante nos sucos brasileiros refere-se justamente à emergência e consolidação de marcas de suco de 100% integral, nota Angélica.
Ela informa que a categoria registra crescimento anual em volume no varejo em torno de 3%, projetando a venda de 1,9 bilhão de litros em 2021, enquanto se espera que as vendas em valor no varejo registrem um avanço de 5% sobre preços constantes de 2016. “Espera-se que os sucos 100% integrais (não concentrado e reconstituído), junto com a água de coco e outras águas engarrafadas atinjam taxas de crescimento mais altas no período, cravando, respectivamente, crescimento anual de 12% e de 6% em termos de volume no varejo”, repassa ela. Ambos, completa a analista, exibem potencial explosivo de crescimento, especialmente nesse momento em que a situação econômica começa a mostrar sinais de recuperação. Esses segmentos, aliás, são foco de grande interesse de consumidores, principalmente os mais jovens e os que procuram estilos de vida saudáveis.
Embalagens pequenas e individuais (200ml /350ml) devem continuar a boa performance, revela o relatório da Euromonitor International, que inclui previsão de 2017 a 2021. “Um número crescente de marcas investe em amplos porfólios de tamanhos e tipos de embalagens, não só para satisfazer novas exigências dos consumidores mas também contribuir para criar novas ocasiões de consumo”, frisa Angélica. Como esses produtos são percebidos continuamente como uma opção saudável para acompanhar uma refeição leve ou para consumo on-the-go, a embalagem prática pode ser fundamental para decisões de compras bem sucedidas, acrescenta. “A embalagem resselável para consumo não frequente, garrafas leves e fáceis de transportar e recipientes esportivos (sports caps) correspondem a esse movimento”, assinala.
A curto prazo, conclui Angélica, a expectativa é de que a categoria de SPB continue sofrendo a competição feroz de sucos concentrados, especialmente das versões em pó. Essa modalidade apresenta um valor mais baixo, embora os fabricantes tenham investido em novas características e benefícios funcionais da categoria. Ainda assim, ela tende a ser mais barata do que outros produtos semelhantes e continua mais atraente durante crises econômicas. “Para consumidores que tiveram seus rendimentos disponíveis comprometidos, essa categoria pode ser interessante”, sublinha a consultora.
Volume crescente
Adquirida pela Ambev em abril de 2016, a marca de sucos Do Bem viu o volume de vendas crescer 105% no primeiro semestre de 2017. “A ideia era mesmo aproveitar a distribuição da companhia e aumentar o número de pontos de venda (PDVs) no Brasil”, comenta Marcos Leta, fundador da marca, ainda à frente da empresa. A Do Bem, repassa ele, está presente em 35 mil PDVs no país, mas a intenção é chegar a 200 mil. “Queremos construir do jeito certo, estar no lugar certo com o produto certo”, afirma Fernando Soares, vice-presidente de não alcoólicos da Ambev.
Segundo Leta, toda a estratégia de negócios e marketing segue centralizada no escritório de Ipanema, no Rio de Janeiro, e a Do Bem mantém a sua independência. A marca de sucos inaugurou em agosto um espaço onde mantém, além da unidade administrativa, um ambiente de eventos para realização de palestras, aulas de ioga e até uma feira orgânica. A publicidade continuará nas redes sociais, sinaliza Leta.
Até o final de 2017, a ideia é introduzir novidades. Sem abrir detalhes, Leta limita-se a dizer que não há previsão de aumento de preços. As embalagens de 1 litro custam em média R$ 7,99. Ao contrário da estratégia para o negócio de cervejas, que visa elevar o número de eventos, feiras e festas que apoiam a marca de sucos vão se concentrar na programação da casa e em eventos menores e diurnos, ligados à moda, gastronomia e tecnologia.
Depois de engolir a cearense Ebba (Empresa Brasileira de Bebidas e Alimentos) em 2015, a britânica Britvic expande sua fatia na cena de sucos com a aquisição da mineira Bela Ischia.
Anunciado no início do ano, o negócio é orçado em R$ 218 milhões e será financiado por instrumentos de dívida da Britvic. “A proposta de aquisição da Bela Ischia representa uma excelente oportunidade para fazer um primeiro ano muito forte no Brasil, com expansão da nossa presença em um grande e crescente mercado de bebidas”, declarou em comunicado Simon Litherland, presidente global da Britvic. Ele acrescentou que a Bela Ischia tem negócios bastante complementares à operação da Ebba no Brasil. A Britvic, concluiu o executivo, espera obter sinergias de custos, com ganhos de eficiência em compras, produção, logística e administração. Também prevê ampliar a receita com o aumento do portfólio de marcas e com a ampliação da presença geográfica, uma vez que as marcas Maguary e Dafruta, do portfólio da Ebba, têm presença mais forte em São Paulo e no Nordeste. ■
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