Estagnado, mas ainda consistente em volume e valor, o consumo brasileiro de chocolate traduz muitos significados. Além de símbolo da indulgência ou autoindulgência, tido como último recurso a ser cortado em caso de crise, por conta do relativo baixo desembolso, é visto também como alternativa ao desemprego, desde quando consumidores aprenderam a manipular a massa e fazer trufas e bombons para vender e complementar a renda doméstica. E a data em que essas facetas tradicionalmente convergem é a Páscoa, tema da reportagem de capa desta edição. Acompanhando a estabilização na produção e demanda dos últimos anos, a comemoração também vem perdendo força. Tanto que, para tentar sacudir a imobilidade, o setor chocolateiro nacional segurou parte dos aumentos de insumos e reajustou os ovos de chocolate em índices abaixo da inflação, além de diminuir tamanhos e baratear as apresentações. Escaldada pela performance da última campanha, em que as vendas de chocolate tiveram um dos seus piores desempenhos, a indústria decidiu reagir preventivamente, renegociando estoques e margens. Segundo a Serasa Experian, que acionou seu indicador de atividade do comércio há oito anos e passou a medir as vendas na data, o giro na Páscoa do ano passado cravou avanço de modestos 3,2% em todo o país. Na cidade de São Paulo, maior centro de consumo, as vendas realizadas na semana pascal caíram 3,7% em relação à mesma semana do ano anterior. Com menos dinheiro no bolso em virtude da inflação alta nos primeiros meses do ano, os consumidores deixaram para comprar seus presentes de Páscoa nos últimos dias, aguardando as promoções do varejo. Foi essa a explicação e, pelo que se observa nos dias de hoje, o cenário piorou. Como se ele já não fosse ruim, em fevereiro veio a notícia de um aumento na alíquota do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) incidente sobre o chocolate. Até então, os chocolates tinham tributação de R$ 0,09 (chocolate branco) e R$ 0,12 (demais chocolates) por quilo. Com o decreto que entra em vigor a partir de maio próximo, os produtos terão alíquota de 5%, cobrada sobre os preços de venda. A Associação Brasileira da Indústria de Chocolates, Cacau, Amendoim, Balas e Derivados (Abicab) informa que ainda avalia os impactos da medida para o setor. Mas em um cálculo rápido, com a mudança, uma barra de chocolate ao leite nacional de um quilo, por exemplo, que tem preço médio de R$ 25, será taxada em R$ 1,25, contra os R$ 0,12 cobrados até agora. Nesse caso, a elevação atinge mais de 900%. Barras de 1-2 quilos, em geral comercializadas em atacados doceiros, sustentam a demanda dos chocolateiros artesanais. Essa atividade, que começou como um hobby de donas de casa, evoluiu para micro e pequenos negócios, que se multilplicaram nos últimos anos, servindo de estribo ao desemprego crescente nas grandes capitais. Qual a lógica de taxar dessa forma um negócio que, além de movimentar a economia, cria empregos formais? •