Doce gangorra

Produção e consumo de confeitos exibem altos e baixos, mas mantêm o país na sexta posição mundial
Balas e caramelos produção acima de 380 mil toneladas coloca o Brasil entre os seis maiores do planeta.

O país tem suado a camisa para se manter entre os primeiros colocados do mercado mundial de confeitos de açúcar (confectionery). Segundo o ranking mais atualizado da Euromonitor International, o Brasil ocupa a sexta posição, atrás da China, EUA, Alemanha, Índia e Rússia. Apesar da projeção no plano internacional, o setor registra altos e baixos na esfera doméstica, com saldo mais para o lado positivo em balanços recentes. Pelas planilhas da Associação Brasileira das Indústrias de Chocolate, Cacau, Amendoim, Balas e Derivados (Abicab), a produção de balas, caramelos, pirulitos e derivados avançou modestos 1,5% no último ano, subindo de 378 mil toneladas (t) para 383 mil t em 2016. Alternativa à tendência de estabilização na cena doméstica, as exportações cravaram alta de 17% no período. Com a queda na renda e a desvalorização cambial, as importações, por sua vez, caíram 20%, repassa a entidade. Com a revisão em curso nos hábitos de consumo, a disseminação de tendências globais de nutrição e as mudanças no estilo de vida, com a intensificação de distúrbios e surtos, como a obesidade, a oferta de confeitos açucarados vem sendo submetida a um acelerado processo de mudanças. É sintomático que a categoria hoje registre receita maior com volume menor, invertendo uma posição que durante anos prevaleceu no segmento. Projeção da Euromonitor International, calcula que o varejo de confeitos açucarados (sugar confectionery) alcance em 2017 receita de R$ 8.264,5 milhões, sem incluir a inflação. De acordo com a consultoria, há cinco anos, as vendas da categoria somaram R$ 7.636,9 milhões (incluída a inflação), e a previsão para o próximo quinquênio indica avanço de 8,2%, fechando em R$ 8.375,4 milhões (ver quadro à pág. 18).

Uma das constatações no setor é que os brasileiros têm consumido menos confeitos açucarados, aumentando a compra de versões com teor reduzido ou zero açúcar, além de guloseimas com apelo natural, especial, funcional e orgânico – subentendida no sabor menos adocicado a mitigação do teor de açúcar, porém não a sua supressão. Assim, a preferência tem recaído sobre itens de maior valor agregado, como essas variantes diferenciadas em formato, cor e sabor, e também sobre marcas tradicionais que puxam inovações e usam e
abusam de ações nas redes sociais. Lançamentos nos moldes convencionais, com ações manjadas como degustações nos pontos de venda (PDVs), podem ainda chamar a atenção do consumidor mas não se convertem em vendas massivas. Ainda assim uma pesquisa do Conecta, plataforma de pesquisa on-line do grupo Ibope, encomendada pela Abicab, captou que caramelos do tipo toffee, com 69% de aprovação; pastilhas e balas de goma – esta em menor intensidade – continuam sendo as modalidades mais apreciadas. Para os fabricantes de candies, essas indicações impõem mais um desafio. “A renda diminuiu e, com isso, caíram os gastos supérfluos, que sustentam o nosso mercado. Além disso, existe a pressão de uma revisão nos hábitos alimentares, que estigmatiza o açúcar e acentua-se cada vez mais a dificuldade de defender posições no varejo”, sintetiza Rosalina Cardoso Vilela, diretora da Erlan, tradicional marca mineira de chocolates, balas e confeitos. Ela, no entanto, considera que, mesmo com todas essas transformações, ainda existem oportunidades a serem alcançadas com inovações nas linhas e embalagens adequadas aos momentos de consumo.

 

Rosalina, da Erlan atenção à oportunidades criadas por mudanças no consumo.

Para a executiva da Erlan, a oferta muitas vezes consegue andar à frente e se transformar na própria tendência. “Há uma oportunidade importante com produtos funcionais e candies com ingredientes naturais”, percebe. A Erlan, assinala a diretora, acompanha essas correntes e avalia constantemente adaptações no mix. “Nos últimos meses promovemos evoluções nas embalagens, revimos gramaturas, testamos formatos para diferentes PDVs e inserimos mais sabores”, frisa Rosalina, adiantando que tem mais novidades na incubadora.

Apesar da paralisação provocada pelo curto-circuito na política e economia do país, a marca mineira conseguiu cravar crescimento acima de 10% no último exercício, fruto do trabalho de vendas e dessa revisão permanente no mix, observa a executiva. “Nesse momento, a gestão de custos assume um papel ainda mais importante, por isso consideramos primordial a atenção nossa e de nossos concorrentes às margens. Precisamos também valorizar nosso produto e não ceder às tentações do pedido fácil, que compromete toda a gestão dos negócios”, adverte ela. Entre revisões de embalagens e a promoção de mais itens no menu, a Erlan renovou em torno de 10% do seu portfólio. Apesar dessa movimentação, o carro-chefe da empresa continua sendo o tradicional Toffee Bombom Erlan, reconhecido nacionalmente pelo diferencial da alta qualidade. “Nosso caramelo com chocolate forma um conjunto imbatível, que todos gostam e, por isso, trabalhamos o produto há décadas, agora em diversas embalagens e sabores além do tradicional, como menta, cappuccino, dark e chocolate branco”, repassa Rosalina. Paradigma no mercado de caramelos, o Toffee Bombom personifica o modelo hoje predominante de item que, apesar de tradicional, evolui incorporando a cada dia as inovações da categoria, que foi captado na pesquisa do Conecta. Recentemente, ressalta Rosalina, a Erlan introduziu uma versão flow pack para venda unitária no check-stand, incorporando a marca à tendência de menor desembolso no varejo de confeitos.

Orso, da Florestal achatamento das margens com linhas submetidas a preço.

Vendas estáveis
Na Florestal, pêndulo do ramo de balas em operação no Sul do país, o gerente de marketing Adriano Orso avalia como estável a venda de balas e caramelos, apesar do registro de quedas pontuais principalmente em 2015 em relação ao exercício anterior. “Os últimos três anos realmente foram desafiadores para o setor, com a inflação da indústria doceira descolada da oficial, exigindo ajustes para enfrentar as turbulências”, relata ele. Alguns itens da categoria de balas e caramelos, entretanto, conseguiram avançar, sendo a composição do mix e marcas oferecida por cada empresa o motor do avanço ou recuo. “Produtos susceptíveis a preço acabaram sofrendo com maior concorrência e achatamento das margens”, assinala. Mas considerando os resultados positivos obtidos pela Florestal no primeiro semestre, Orso estima melhoras no cenário para o fechamento do ano.

Uma das características da Florestal na cena de balas é a disposição permanente de lançar produtos. Desde 2016 até agora, a empresa inseriu nove itens no mix. Prova da eficácia dessa estratégia, no último semestre as vendas avançaram 16,5% sobre o mesmo período do ano passado, crava Orso. Diferentemente de concorrentes, a Florestal exibe não um produto ou marca mas um menu de carros-chefe, do qual o gerente destaca as linhas BrazilianCoffee, Balinha do Coração e Bala Canela. Sob a grife Boavistense, controlada do grupo Florestal Alimentos, ele assinala as marcas Sonhare, prestigiada há quase duas décadas, e a tradicional Banzé, a “bala do cachorrinho”, entre as principais no reduto de balas mastigáveis do país. “Tanto a bala de café como a de formato de coração foram pioneiras em suas categorias e, ao lado da bala em formato de bolinha e sabor de canela formam um volume pesado de vendas até hoje para a companhia”, resume o gerente.

Conjunto imbatível tradicional caramelo da Erlan agora em diferentes versões.
Speltri, da Peccin adaptação de tendências mundiais ao paladar doméstico.

Carlos Speltri, gerente de marketing da Peccin, outra força do setor com sede no Sul do país, confirma que o mercado geral de balas sofreu retração no início da década atual. Mas nos últimos três anos ele observa uma tendência de retomada nos patamares de volume em categorias específicas. “O mercado brasileiro possui características próprias e a indústria tem conseguido atender às demandas, adaptando muitas tendências mundiais ao paladar doméstico”, argumenta Speltri. Entre essas correntes ele inclui o uso de aromas naturais. A Peccin, a propósito, capturou essa sacada na linha Pura de balas mastigáveis drageadas e recheadas, que utilizam somente essências naturais de frutas. “Também percebemos um espaço para sabores mais exóticos, onde inserimos a bala mastigável recheada Açaí Brasil, com excelente receptividade”, informa ele.

Além dessas tacadas, a Peccin banca apostas no circuito de produtos de maior valor, inserindo na linha Tribala, carro-chefe da empresa no front de balas mastigáveis especiais, um item que se escora nos apelos de indulgência e experiência de consumo. “Trata-se da versão Banana Caramelada, bala mastigável com base frutal que imita a experiência de degustar uma sobremesa”, descreve Speltri. Apesar de reconhecer o movimento crescente em prol da redução de produtos açucarados, ele considera que continuará existindo espaço para produtos indulgentes, inspirados na entrega de sabor e prazer. “A redução de açúcar é uma tendência que vem se consolidando, e já há uma parcela do mercado voltada a esse tipo de produto”, sublinha. Ele frisa que a linha Tribala conferiu à Peccin pioneirismo no lançamento de uma bala mastigável drageada com recheio e essa inovação se traduz em liderança da marca.

Demanda crescente

Sidney Bratt, da Gourmand: foco em balas e caramelos importados.

Na ativa há mais de 27 anos, a Gourmand Alimentos é atualmente a principal supridora de confeitos importados, com distribuição em todo território nacional. Segundo Sydney Bratt, diretor da importadora, a empresa busca em feiras internacionais de alimentos marcas e linhas consagradas no circuito gastronômico, além das novidades do segmento de confectionery para  introdução no mercado doméstico. “São centenas de produtos que agradam os diversos paladares e, entre as marcas internacionais trazidas ao Brasil, somos responsáveis pelas alemãs Milford, Weinrich e Schneekoppe; pela belga Delafaille, a holandesa Droste, a inglesa After Eight; as norte-americanas Campfire e Pepperidge Farm e as suíças Halter e Villars, além da francesa Jacquot e diversas outras de dezenas de países”, repassa o trader. Na entrevista a seguir, ele detalha a demanda atual de candies importados no Brasil.

DR – Como avalia o consumo de balas/caramelos importados?
Bratt –  O consumo desse tipo de produto é, com certeza, crescente, pois é o segmento que  apresenta as mais recentes e importantes inovações no campo industrial e de marketing, exibindo linhas muito diferenciadas em relação às nacionais.

DR –A oferta de produtos e o consumo acompanham as tendências mundiais?
Bratt – Na verdade, é muito difícil o consumo conseguir acompanhar as tendências mundiais na velocidade em que elas aparecem. A oferta de produtos fabricados no exterior é muito superior ao nosso consumo. A oferta de produtos nacionais é significantemente menor que a internacional, e muitas vezes apenas acompanha as tendências externas.

DR –Quais dessas tendências se traduz em produtos distribuídos pela Gourmand?
Bratt – Nosso foco são as balas e caramelos com características diferenciadas das produzidas no mercado brasileiro. Buscamos trazer para o Brasil a inovação que vemos em outros países. Trabalhamos, por exemplo, com a marca Storck de caramelos que são deliciosos e têm um gosto marcante. São múltiplas variações de balas e a maioria não tem concorrentes no mercado brasileiro. Em 2016, introduzimos a linha irlandesa de balas Jelly Bean, em 36 sabores, todos naturais e sem glúten, que tem sido um sucesso absoluto. Lançamos também o sabor Cappuccino na linha de balas sem açúcar da Stork.

Hoje temos como carro-chefe a linha suíça de balas sem açúcar Halter. São mais de 20 sabores, inclusive algumas versões com chocolate sem açúcar, seguindo a tendência de redução de açúcar.

DR – Aliás, como avalia esse movimento a favor da mitigação de produtos açucarados?
Bratt – É uma tendência positiva e a Gourmand enxerga como uma oportunidade. Já incorporamos essa tendência há alguns anos, quando começamos a buscar também alternativas de balas e caramelos com formulações sem açúcar. A maior dificuldade é subtrair o ingrediente e preservar o sabor, trunfo que pode ser observado nas marcas com as quais trabalhamos.

DR – Como vem se comportando as vendas desses itens importados?
Bratt – Elas vêm crescendo a um passo estável. No ano passado, as vendas de balas e caramelos cresceram quase 8% em relação ao ano anterior.

Freire, da Arcor com as redes sociais, inovações globais impactam a demanda de balas.

 Sem açúcar

Para Anderson Freire, gerente de marketing de biscoitos, chocolate e guloseimas da Arcor, balas e derivados apresentaram leve crescimento em faturamento nos últimos anos, apesar da queda acentuada em volume. “Foi principalmente pela ascensão dos segmentos de maior valor, como drops, balas de gelatina e chicles sem açúcar, que trouxeram inovações e se enquadraram na nova realidade do consumidor”, percebe. Antenados, acrescenta Freire, os consumidores brasileiros estão sempre de olho nas novidades e, com a internet e as redes sociais, as inovações globais acabam impactando a demanda.

“Um reflexo disso é a linha Grego, inspirada na arrancada dos iogurtes do tipo grego, incorporada à marca de caramelos Butter Toffees; e o novo sabor chocolate Amargo, que é outra tendência mundial”, exemplifica o executivo. Marca número um da Arcor no reduto de balas, a Butter Toffees sobressai na categoria de caramelos com diferenciais de qualidade, associados à cremosidade, ao recheio e a um amplo portfólio de sabores. “A marca tem um relacionamento de mais de 30 anos com o consumidor e segue como líder na categoria, possuindo 81% de share volume”, repassa Freire.

Negreiros, da Hué ingresso na União Europeia através de distribuidor espanhol.

Na garupa da trilha aberta pelo consumo de balas isentas e açúcar, a Hué Alimentos se inseriu na estatística de crescimento do setor em pleno ciclo de estabilidade. Nascida em São Lourenço (MG), a empresa abriu as portas 30 anos atrás com a fabricação de uma linha de caramelos, que fez nome na cidade e região como as “balas pretinhas”, receita familiar transmitida de pai para filho, informa Daniel Negreiros, gerente comercial da empresa mineira. “Nos últimos anos observamos o potencial de crescimento nas vendas da linha de caramelos de leite diet, antes consumida apenas por diabéticos e hoje estendida a um público maior, que compreende consumidores em busca de alimentação saudável”, comenta o executivo.

Para ele, esse filão ascendente exige sortimento para que esses consumidores encontrem no ponto de venda (PDV) itens adequados às diversas ocasiões de consumo. Assim, a Hué oferece uma linha completa que desdobra o caramelo de leite diet em versões com chocolate, café e morango, além da variante meio a meio, com metade de cada versão. “Ainda temos uma parceria com uma empresa farmacêutica para a produção de um caramelo enriquecido com cálcio e vitamina D”, informa Negreiros, acrescentando que, no front exterior, a Hué embarca sua linha de caramelos diet para o mercado europeu, através de um distribuidor da Espanha.

Sabores inovadores busca permanente de novidades na Peccin.
Carvalho, da Santa Rita linhas mais interessantes com ingredientes diferenciados.

Para a fabricante de balas Santa Rita, o baque da crise nos últimos anos gerou problemas no abastecimento de insumos commodities, pressionando custos e exigindo ajustes com repasse para o mercado, observa Bruno Almeida Carvalho, gerente de marketing da indústria mineira. “Buscando atender à demanda, introduzimos ingredientes diferenciados para tornar as linhas mais agradáveis e interessantes, a exemplo de pirulitos com sabores marcantes, que hoje formam a linha de azedinhos”, reporta o executivo. Para ele, as maiores tendências em confeitos açucarados refletem a busca de novas experiências de consumo e o uso de sabores inusitados. “Além disso, avança cada vez mais a demanda de itens diet e com ingredientes naturais”, observa.

Atenta a essa movimentação, a Santa Rita enfatiza sua linha de balas mastigáveis sortidas, segundo Carvalho, a única no mercado com derivados de leite e maior variedade de sabores em uma única embalagem. “Outro item chave no nosso mix são os caramelos ao leite que, inclusive, ganharam o Prêmio Doce Revista, no ano passado”, frisa ele. •

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