A onda que se espalha

Volumes cada vez mais baixos e receita em trajetória de alta dimensionam o negócio de gomas de mascar no Brasil
Gomas de mascar mercado acentua tendência de queda em volume e alta em valor.

Decrescente em volume e ascendente em valor, a curva das vendas de gomas de mascar deixa o setor de insumos e máquinas com as barbas de molho. A demanda ainda pulsante no segmento privilegia linhas mais elaboradas, de maior valor na forma e apresentação e tecnologicamente mais sofisticadas. Mas para viabilizar essa oferta mais premium é preciso empregar matérias-primas de alta qualidade, em geral importadas, e linhas de fabricação atualizadas, também trazidas de fora do país. Com investimentos praticamente parados por conta da crise político econômica, a indústria deixa escapar a oportunidade de suprir os nichos mais atraentes e expandir a oferta e o consumo no segmento. “Na crise financeira internacional, sete anos atrás, o filão de gomas de mascar registrou um ganho, com a desvalorização da moeda e aumento das exportações. Mas na atual, os embarques não crescem, mesmo com o câmbio favorável, forçando uma freada na produção”, analisa Juliano Benassi, consultor de mercado, especializado no reduto de matéria-prima para gomas de mascar.

Monitoramento da Euromonitor International confirma que o consumo de gomas de mascar na ponta do varejo despencou de 58 mil toneladas (t) em 2010 para 47,4 mil t no ano passado, cravando queda de 22,5% no período. Já em valores, o giro avançou de R$ 3,352 bilhões para R$ 4,237 bilhões, registrando salto de 26% no mesmo período. Pelas projeções da consultoria, as vendas de gomas de mascar devem cair para 46,6 mil t até 2020, enquanto a receita deve avançar para R$ 4,738 bilhões (ver quadro à pág. 18). Apesar do declínio decorrente da estagnação geral de confeitos açucarados entre 2013 e 2014, o volume de vendas do segmento de gomas de mascar crescia em torno de 2% no Brasil. No último ano, porém, a referência se tornou negativa. Com a expansão natural do consumo e o ingresso de novas categorias ao longo dos últimos dez anos não é incoerente os volumes decrescerem, abrindo espaço para as inovações que agregam valor à categoria. “É um processo que acompanha o cenário global, em especial nos mercados mais desenvolvidos, refletindo o amadurecimento do consumidor que busca produtos de alta qualidade, associados a maior prazer”, observa Benassi.

Entre as tendências que puxam as vendas de gomas de mascar na cena atual, ele considera ainda consistente a demanda de desenvolvimentos envolvendo gomas drageadas, especialmente as isentas de açúcar, com ou sem recheio líquido e as variantes que incorporam princípios ativos funcionais, a exemplo de edulcorantes anticariogênicos ou branqueadores dentais. “Produtos com essas características cravaram alta nas vendas em torno de 15% em 2015”, repassa o consultor. Mas pela sua avaliação, mantido o câmbio que beneficia as exportações e penaliza as importações, o desenvolvimento desse filão encontra-se sob ameaça. Ocorre que alguns dos principais ingredientes da goma base ou especialidades da própria goma base são importados. “No último ano, em decorrência da desvalorização da moeda e aumentos nos insumos e tributos, a goma base produzida no país sofreu um reajuste médio de 16%, isso em um mercado já cauteloso e retraído, com baixas vendas, principalmente, devido ao aumento da inadimplência”, observa Benassi.

Ainda em fase de incubadora no país, projetos de chicles com apelo ecológico, como o que incorpora goma base biodegradável, certamente ainda irão vingar em curto espaço de tempo, considera o especialista. Na Europa e nos EUA, acrescenta ele, o apelo avança de braçadas e já atinge 10% do faturamento total da categoria de gomas de mascar, representando  2% do volume produzido. Pela sua calculadora, a demanda de goma base no Brasil registrou em 2015 retração em torno de 20% no geral, com as versões para chicles mais populares, tidas como commodities, assinalando queda de 15%. Em 2014, a produção e venda de goma base no país alcançou 13.200 toneladas, volume que, no ano passado, caiu para 10.400 toneladas, incluindo a performance das principais fabricantes locais e as indústrias de candies que fabricam goma base para consumo cativo. “Para 2016 há uma expectativa de recuperação do mercado, com apostas no aumento de exportação de goma base, uma vez que a desvalorização da moeda  deixa os preços mais atrativos, principalmente para países da América do Sul e do bloco do Mercosul”, sinaliza o consultor que, até recentemente, integrou o time técnico-comercial da Sweet Gum, marca da goma base da brasileira Socer, fornecedora número um do insumo no país.

Goma em pellets
Fonte de resinas naturais controlada do Grupo RB, a Socer opera no reduto de goma base desde 2011, através de uma moderna planta instalada em Itapetininga (SP). Com investimento orçado em R$ 7 milhões, a unidade opera com processo 100% automatizado e exibe capacidade em torno de 1.500 toneladas mensais de goma base em pellets, formato que facilita a dissolução do insumo nas formulações de confeitos.
Benassi explica que a goma base é, em geral, fornecida no padrão flake ou em blocos de 25 quilos, que exigem etapa de fracionamento. “No formato de pellets, pode ser entregue na exata quantidade (em quilos) usada na formulação dos clientes, eliminando pesagens e riscos de contaminação, que pode ocorrer após a abertura da embalagem sem a total utilização do conteúdo”, frisa ele.

Antes de ingressar na arena de goma base, a Socer abastecia o mercado de éster de glicol, um dos ingredientes (ester gum) da goma base, fornecendo para fabricantes como a Arcor e Mondelez, que formulam a própria base. Mas com o avanço da demanda doméstica e oportunidades surgidas na esfera das exportações, o grupo decidiu ingressar no segmento com a instalação da fábrica em Itapetininga. Para isso, investiu em duas linhas de extrusão/mistura Sigma, com capacidade de duas toneladas por batelada cada, e cogita instalar uma terceira máquina para expandir a produção. Segundo a empresa, a unidade de Itapetininga foi projetada para receber seis linhas. O plano imediato é dobrar a capacidade atual e, em quatro anos, atingir o potencial de 6.000 toneladas.

Através da trilha aberta pelas exportações de ester gum, que segue para mais de 10 destinos, a Socer também iniciou exportações de sua goma base. Em termos de qualidade, a empresa informa que o produto nada deve a contratipos do mercado global como os da italiana Gum Base Co. (controlada da Perfetti Van Melle) ou da espanhola Cafosa (empresa da Wrigley, controlada da Mars). Entre os maiores compradores de goma base da companhia sobressaem a Colombia, Peru, Equador e países da América Central. A Socer hoje atua nos três segmentos de goma de mascar: convencional (de chicles de bola do tipo brick), non sticking (para drageados ou gomas recheadas tipo Bubbaloo) e chewing gum (para produtos isentos de açúcar).

Máquinas: mercado restrito
Se do lado dos insumos, o mercado doméstico é servido por supridores locais com know-how em dia com o mundo, no campo das linhas de produção o cenário é diferente. Nos cinco últimos anos, categorias como chocolate puxaram os investimentos em maquinário. “A maioria foi para projetos importantes nas grandes multinacionais, assim como pequenas e médias instalações autônomas de processamento de massa de chocolate e compounds para os pequenos e médios fabricantes. Tivemos muitos projetos para a nossa representada Netzsch”, contabiliza Thomas Koblinsky Jr., diretor da Komatec, representante de grifes globais de máquinas para o setor de confectionery. Ele explica que entre as supridoras de linhas para gomas de mascar desponta a alemã Bosch, cuja divisão Confectionery & Food é representada no Brasil pela Komatec. Em 1996, relata o trader, a Bosch adquiriu a francesa Togum, incorporando o que era na época o maior fabricante de máquinas para a indústria de gomas de mascar. Até hoje, a marca ainda é sinônimo de tecnologia em sistemas para fabricação de chicles de todos os tipos.

Nas últimas duas décadas, a Bosch forneceu inúmeras linhas de gomas de mascar para o Brasil e o mundo, sendo os itens fabricados nessas instalações encontrados na maioria dos pontos de venda (PDV) do país, reporta o executivo, sem precisar números. A Komatec, ele completa, assumiu o fornecimento de diversas dessas linhas. A mais recente, no entanto, foi instalada em 2014, para produtos ocos, recheados com pós, fabricados com uma máquina formadora dupla de alta capacidade WAD 0080, detalha. “O Brasil é um mercado restrito. Quando surge um projeto novo, sempre envolve um investimento grande. Equipamentos tradicionais, de tecnologia Cut&Wrap, por exemplo, para chicles convencionais, ainda tem o seu espaço, mas existem muitos equipamentos usados no mercado”, argumenta Koblinsky Jr.

Predomínio convencional
De olho nos indicadores do mercado de candies, ele atesta que o segmento de gomas de mascar está em retração. Em 2015, situa, a Komatec participou de projetos nas áreas de caramelos depositados, marshmallows e balas de goma, todos de grande porte, porém pontuais com poucos clientes. “Não dá para dizer que essa demanda sinaliza uma tendência de mercado”, sublinha o dirigente. Nos últimos meses, ele observa uma retração considerável, tanto em chocolates como em candies, mas uma retomada, apesar da crise, de investimentos no reduto de  biscoitos. “Os volumes de chocolates e candies provavelmente devem cair, porém biscoitos, que é um elemento praticamente da cesta básica, tende a crescer”, observa Koblinsky Jr.
No campo das tecnologias, ainda predominam as linhas mais convencionais. Foram as fabricantes de grande porte que introduziram no país linhas sofisticadas, a exemplo do tipo Rolling&Scoring para fabricação de gomas laminadas (sticks, pellets, slabs), com e sem açúcar, com capacidades de até 4.500 quilos/hora; e linhas do tipo Ball-forming, para produtos ocos ou recheados. Segundo o diretor da Komatec, linhas Ball-forming geram consultas permanentes. “Tivemos muitos projetos, mas a tecnologia precisa ser mais conhecida, com o devido desenvolvimento de matérias-primas adequadas, pois não é um produto fácil e o investimento não é baixo, o que acaba desestimulando os projetos”, comenta o trader. As linhas Rolling&Scoring também incorporam tecnologia complexa, de altos custos, que poucos players do mercado têm condições de investir. “Por isso, existem muito poucas linhas no Brasil e é um mercado restrito”, sublinha.
Para Koblinsky Jr. a grande sacada no filão de gomas de mascar está no desenvolvimento de ingredientes, como cápsulas de aroma, insumos funcionais (odontológica e hálito fresco) e mix de sabores exóticos. Do ponto de vista dos formatos e tecnologias de fabricação, não existem muitas variantes, já que goma base e açúcar ou adoçante são a base do produto, ele considera. Ball-forming, Rolling&Scoring e Cut&Wrap são as tecnologias disponíveis, com pequenas variações, a exemplo da coextrusão com duas cores ou recheios. “Temos também o estampado, para chicles recheados, para o qual a Bosch colocou muitas linhas. Esse mercado parece estar estagnado, provavelmente devido ao desestímulo ao consumo infantil de gomas de mascar  açucaradas. Os produtos estão no mercado, mas não vemos mais investimentos, apenas uma guerra de preços no varejo”, conclui. •

Deixe um comentário

Novos Tempos